Ruriá Duprat: a produção musical do ganhador do Grammy S N I F A & Ano 2 - Número 14 - Junho 2015
Eliane Elias
www.teclaseafins.com.br
A pianista fala sobre o novo álbum, que marca seu retorno ao estilo que a consagrou
Sidinho Leal Referência nas redes sociais fala sobre carreira e consultoria
E mais: mais : Como manter os dedos em forma Análise estrutural e harmônica Canção americana em bossa nova Os pioneiros do Hammond no Brasil
MOOG MODULAR A recriação dos dinossauros
S N I F A &
Ano 2 - N° 14 - Junho 2015 Publisher
Nilton Corazza publisher@teclaseafins.com.br Gerente Financeiro
Regina Sobral financeiro@teclaseafins.com.br Editor e jornalista responsável
Nilton Corazza (MTb 43.958) Colaboraram nesta edição:
Alex Saba, Eloy Fritsch, Ivan Teixeira, Jackson Jofre, José Osório de Souza, Rosana Giosa, Turi Collura, Wagner Cappia Diagramação
Sergio Coletti arte@teclaseafins.com.br Foto da capa
Divulgação Publicidade/anúncios comercial@teclaseafins.com.br Contato contato@teclaseafins.com.br Sugestões de pauta redacao@teclaseafins.com.br Desenvolvido por
Blue Note Consultoria e Comunicação www.bluenotecomunicacao.com.br Os artigos e materiais assinados são de responsabilidade de seus autores. É permitida a reproduação dos conteúdos publicados aqui desde que fonte e autores sejam citados e o material seja enviado para nossos arquivos. A revista não se responsabiliza pelo conteúdo dos anúncios publicados.
EDITORIAL Quem faz música são os músicos! Essa afirmação, por mais óbvia que possa parecer, é necessária nos tempos atuais, em que muita gente acredita em fórmulas mágicas, equipamentos que tocam sozinhos, produções automáticas e pouco estudo. Como disse Cesar Camargo Mariano, em entrevista na edição 13 de Teclas & Afins, talento é fundamental. Mas só ele, na maioria das vezes, não é o suficiente. Bem trabalhado, tende a aumentar. Mal aproveitado, é um desperdício. Mas os instrumentos musicais também fazem parte dessa equação. E por isso se chamam instrumentos, como também lembrado por Mariano. São ferramentas necessárias e preciosas, sejam elas quais forem. Mas nem músico nem instrumento consegue produzir música sozinho. Em tempos em que a tecnologia é divinizada e o talento é diminuído, Teclas & Afins faz questão de deixar claro que a equação entre esses fatores só funciona quando o primeiro, o talento, se sobrepõe ao segundo, a tecnologia. E, ao lado disso, está o conhecimento, o estudo, a dedicação e o trabalho. Essa é nossa missão: transmitir informação para fermentar o talento, proporcionar a compreensão do fenômeno musical e ensinar como fazer bom uso da tecnologia, para que a equação tenha resultado positivo. Nesta edição, por exemplo, nossos entrevistados demonstram, na prática, o sucesso dela. Sidinho Leal utiliza seu talento para extrair da tecnologia o que ela pode oferecer. Ruriá Duprat, a coloca como meio para a produção de qualidade, seja para a indústria fonográfica ou para a publicitária. Apresentamos também como a Moog, por meio de seus sintetizadores modulares, oferece ferramentas mais complexas para a criação musical. E o que falar de Eliane Elias? Talento, puro talento! Boa leitura! Nilton Corazza
Rua Nossa Senhora da Saúde, 287/34 Jardim Previdência - São Paulo - SP CEP 04159-000 Telefone: +55 (11) 3807-0626 4 / junho 2015
Publisher
teclas & afins
NESTA EDIÇÃO
42 livre pensar
O Arquiteto por Alex Saba
VOCE EM TECLAS E AFINS 6
O espaço exclusivo dos leitores
46 vida de musico
O que fazer para manter-se em forma Entrevista 8
Por Ivan Teixeira
Sidinho Leal Referência nas redes sociais
48 palco
Estrutura tecnológica INTERFACE 12
As notícias mais quentes do universo das teclas
Por Wagner Cappia 50 puxando fole
retrato 16
Os grandes festivais e competições mundiais
Ruriá Duprat
Por Jackson Jofre Rodrigues
A produção musi cal do ganhador do Grammy
52 cultura hammond
Hammond no Brasil: os pioneiros Vitrine 22
Por José Osório de Souza
Novidades do mercado materia de capa 28
Eliane Elias
Canção americana em ritmo de bossa nova
Made In Brazil
por Rosana Giosa
sintese 36
60 harmonia e improvisacao
A recriação dos sintetizadores modulares Por Eloy Fritsch
teclas & afins
56 arranjo comentado
Aprendendo com os gigantes: análise harmônica e estrutural por Turi Collura
junho 2015 / 5
vOCE em teclas & afins
Vamos nos conectar? Mestre Cesar! Parabéns pela matéria, Teclas & Afins (Fábio Augusto, em nossa página no Facebook)
Dicas superpreciosas! Gostei bastante! (Jefferson Henrique Xavier, em nossa página no Facebook)
Muito bom! Mestre Cesar! Existe essa entrevista completa, sem cortes, pra gente conseguir ver? Obrigado! (Daniel Sellanes, em nosso canal no Youtube) R.: Sempre dizemos que quando o entrevistado tem o que falar, nosso trabalho é facilitado. Cesar Camargo Mariano, ídolo de todos, é extremamente inteligente, simpático e bem articulado. O resto da entrevista foi tr anscrito e está nas páginas da edição 13 de Teclas & Afins.
Ótimo review (Review Casio Privia PX-5S). Como pianista, fico até pensando em trocar meu FP7F nesse aí. Será que vale a pena? Pois o Roland também tem boas teclas? Valeu! (IvaNovici R., em nosso canal no Youtube)
Cara, parabéns pelos timbres (Review ARP ODISSEY). Era exatamente o que eu precisava escutar para ter uma ótima impressão! :D :D :D (Patrick Wichrowski, em nosso canal no Youtube) R.: A questão de escolha de um instrumento musical é muito particular. Nosso objetivo com os reviews é apresentar as opções com o ponto de vista de um músico acostumado a diversos equipamentos e marcas, citando os pontos positivos e negativos de cada um. Mas nada melhor que experimentar e ouvir o instrumento para decidir.
Acabei de conhecer a revista por indicação do Cesar Camargo Mariano. Só tem feras dos pianos e teclados nas entrevistas! Muito maneiro! Parabéns! Desejo muito sucesso e felicidade na empreitada! (Sergio Marcio, em nossa página no Facebook) A revista mais completa do Brasil! ;) (Bruno Fonseca, em nossa página no Facebook) Muito legal a iniciativa para nós, tecladistas! (Rodrigo Vie, por e-mai) Parabéns a revista está ótima! Muito legal ver Rosana Giosa, Turi Collura, Wagner Cappia e muitos outros colaborando e valorizando a Teclas & Afins! Beijo e mais sucesso! (Geni Leika Hirano, em nossa página no Facebook)
Matéria bem escrita (Distorção no Hammond), objetiva e com conteúdo. Vale a pena ler! (Matheus Pagliacci, em nossa página no Facebook) R.: Agradecemos a todos. Esses comentários nos fazem perceber que estamos no caminho certo. Nosso time de colunistas é o melhor do mercado editorial brasileiro. Temos orgulho dessa equipe. 6 / junho 2015
teclas & afins
vOCE em teclas & afins
Mostre todo seu talento! Não importa o instrumento: piano, órgão, teclado, sintetizadores, acordeon, cravo e todos os outros têm espaço garantido em nossa revista. Mas tem que ser de teclas! Como participar:
1. Grave um vídeo de sua performance. 2. Faça o upload desse vídeo para um canal no Youtube ou para um servidor de transferência de arquivos como Sendspace.com, WeTransfer.com ou WeSend.pt. 3. Envie o link, acompanhado de release e foto para o endereço contato@teclaseafins.com.br 4. A cada edição, escolheremos um artista para figurar nas páginas de Teclas & Afins, com direito a entrevista e publicação de release e contato. Teclas & Afins quer conhecer melhor você, saber sua opinião e manter comunicação constante, trocando experiências e informações. E suas mensagens podem ser publicadas aqui! Para isso, acesse, curta, compartilhe e siga nossas páginas nas redes sociais clicando nos ícones acima. Se preferir, envie críticas, comentários e sugestões para o e-mail contato@teclaseafins.com.br
teclas & afins
junho 2015 / 7
especial
Nilton Corazza
Sidinho Leal: referência em tecnologia
8 / junho 2015
teclas & afins
especial
O explicador Postando vídeotutoriais na internet sobre os recursos de diversos teclados, Sidinho Leal construiu uma sólida reputação e conquistou milhares de seguidores Tecladista desde os 17 anos, iniciando as atividades com grupos de jovens nas igrejas e tocando teclado arranjador em pequenas festas da cidade de Sabará, em Minas Gerais, Sidinho Leal passou por bandas de axé, pagode e samba até ingressar em uma banda de bailes em 2003. Foi a partir daí que começou a usar os recursos avançados dos workstations. “Nessa época, era preciso ler muito o manual para entender o funcionamento dos produtos. A partir de 2008 passei a pesquisar mais na internet, mas ainda não encontrava tutoriais. Em 2009, postei meu primeiro minitutorial, do Fantom X7”, conta. Esse foi o início de uma carreira voltada à consultoria em tecnologia musical. Famoso pelos vídeos tutoriais que posta na internet, Sidinho Leal mantém a simplicidade ao falar do trabalho que realiza: “Levo como base da minha criação ‘ajudar para ser ajudado’, sempre com muita simplicidade e sem humilhar ninguém. Independentemente do valor do produto que o músico tem, sempre o tratar com respeito”.
mais acessíveis no mercado, muitas pessoas estão entrando em escolas de música para aprender a tocar, principalmente na área das teclas. Com tantas novidades e a variedade no mercado, surge a dúvida: “Qual teclado devo comprar? “. É aí que eu entro (risos). Tento filtrar uma lista para que o músico possa fazer a compra certa e investir em um instrumento que vai se encaixar no perfil de trabalho dele. Como venho fazendo isso há anos, de forma despretensiosa, com os famosos “tutoriais”, acabei ajudando muitos com esses vídeos. Com o passar do tempo, tentei caprichar um pouco mais na qualidade e isso foi trazendo visibilidade. Fico extremamente feliz e grato a essa massa tecladística que curte e me motiva a produzir mais vídeos e repassar essas dicas. Como recebe feedback de suas postagens?
Fico muito sem-graça, pois sou bem tímido. Mas tento responder a todos que me chamam nas redes sociais. Vejo alguns postando fotos com meu material e me deixa muito feliz saber
Como é ser reconhecido como profundo conhecedor da tecnologia voltada à música?
Não me considero um grande conhecedor da tecnologia aplicada à música, mas sou um cara que adora pesquisar sobre o assunto e faço isso com muito prazer. Uma coisa de que não abro mão é repassar o que descubro nas novas tecnologias para os tecladistas que me seguem. Hoje, com equipamentos com preços teclas & afins
Banda Brilhantina: 80% ao vivo junho 2015 / 9
especial
que comecei a buscar possibilidades que antes nem imaginaria, como programar multisamples, gravar violões, backing vocal e percussão, tudo no próprio teclado, dispensando Notebook ou PC. Achei isso sensacional. Mas para mim, na época, era muito complexo. Foi aí que precisei encarar o manual do proprietário, que quase ninguém lê (risos), e aprender “na marra” a dominar os recursos. Isso foi abrindo caminho para os próximos, como Fantom X, Motif XS, Korg M3, Tecnologia à mão: faciltar o trabalho do músico Korg Kronos, Nord Stage, entre vários outros que a pessoa confia no que digo, no que posto que tive, e fui descobrindo os recursos. A fui na internet. É sinal de que tenho o dever de ser aproveitando para postar vídeos sobre eles. sempre honesto e sincero. Recebo isso com muito carinho e sempre atento para jamais A grande quantidade de tecnologia embarcada nos teclados não inibe a faltar com a verdade. criatividade do músico? Qual foi a de maior sucesso?
Há um vídeo que produzi - e é um dos mais amadores, feito em casa, em um quarto em reforma, com uma máquina fotográfica – que tem mais de 70 mil views no Youtube. É um tutorial sobre sintetizador Roland Juno-Di. É dos mais vistos no meu canal, mas há outros com muitos acessos também, como os novos vídeo-reviews, que venho produzindo, desde 2013, em parceria com a Roland Brasil. Qual foi seu primeiro teclado?
Esse a gente nunca esquece: foi um Yamaha PSR540, em 1998, comprado com meu próprio dinheiro de shows. Mas o primeiro contato com as teclas foi em um Kawai FS690, em 1995. E qual foi o primeiro que exigiu de você se aprofundar na programação?
Este me lembro bem: foi um Roland Juno-G. Antes dele eu tinha um Roland JV-1000, mas ao saber do Juno, em 2006, com recursos de leitura de samples, tracks de áudio, sequencer poderoso, adquiri o meu em 2007. Foi então 10 / junho 2015
Esse é um ponto que considero extremamente importante. Venho falando com vários músicos que não devemos ser reféns da tecnologia. Ela existe para ser usada, mas temos que ter bom-senso e saber dosar isso de forma que o músico esteja sempre ali, presente e atuante. Hoje, com tantos recursos, se deixar a coisa sem freio, o músico “preguiçoso” vai acabar gravando tudo, inclusive as bases (risos), e no show, apenas apertar o play. Isso já é possível há muito tempo. A tecnologia vem evoluindo tanto, que temos que ficar atentos. Cobro muito isso da galera: se preocupar em programar seu instrumento, mas também valorizar o “tocar” ao vivo. Vou citar meu exemplo: trabalho na Banda Brilhantina, em Belo Horizonte, desde 2008. Meu empresário, Giuliano Kill, me contratou por justamente querer um músico que tivesse mais intimidade com a produção de VS (Virtual Sampler), que são trilhas de apoio para a banda ao vivo. Mas desde nosso primeiro contato, disse a ele: “Giu, vamos usar o VS como apoio. Farei 70 a 80% dos teclados ao vivo no palco. O que vou gravar será apenas o que realmente ficar teclas & afins
especial
impossível reproduzir em duas mãos”. E tem Quais as dúvidas mais recorrentes? sido assim há 7 anos. Geralmente esses músicos não tem tempo para ficar programando seus instrumentos, Quais as habilidades que um tecladista deve pois a logística dos shows é bem complicada. Às vezes, no mesmo dia, fazem show em ter hoje, além de tocar bem? Tenho várias referências na música: Michel Londrina e a tarde viagem para Cuiabá (risos). Camilo, Cesar Camargo Mariano, Chick Corea, Isso gera um problema: o pouco contato que Dream Teather, chorinho em geral, MPB, têm com seu instrumento. Então, acabam música erudita e pop internacional, além de me chamando para dar essas consultorias. vários outros gêneros. Na verdade escuto Geralmente funciona. Eles chegam um de tudo um pouco, apesar de ser músico pouco antes do show e programam seus autodidata. Acredito que para um músico instrumentos, ou levam algum arquivo para se tornar profissional é preciso dominar um leitura. São quase sempre dúvidas simples, pouco de cada gênero, pois o mercado está como inserir novos sons, montar splits, ler muito versátil. Tocar um pouco de cada coisa programações em teclados alugados por é importante, ainda mais para tecladistas, pois causa da logística, coisas de tecladistas (risos). nosso instrumento “imita” vários outros. É bom conhecer um pouco de tudo para conseguir Quais seus projetos atuais? expressar nas teclas o máximo de verdade de Atualmente estou trabalhando como cada instrumento. tecladista na Banda Brilhantina em Belo Horizonte. Os trabalhos que fiz recentemente Para quais artistas tem prestado consultoria? foram duas vídeo-aulas de programação Tenho muitos amigos para quem venho em DVD: um do Korg Kronos, em meados repassando dicas e, inclusive, programando de 2014, e um sobre o Yamaha Motif XS/XF, seus instrumentos. Podemos citar Daniel lançado em abril deste ano. Mas já tenho Silveira (Mateus e Kauan), Marciano Santos pedidos para preparar mais DVDs para vários “Brigs” (Jorge e Mateus), Felipe de Castro outros teclados do mercado. A aceitação (Henrique e Diego) Marcinho Hipólito (Michel desse material tem sido muito boa, pois Teló), Daniel Pereira (Taeme e Thiago), Duda isso, até então, não existia. O músico tinha Mell (Humberto e Ronaldo), Wemerson sempre o manual e alguns vídeo-dicas no Pequeno (Cristiano Araújo) e vários outros. A Youtube, mas estes têm sido os primeiros lista é bem grande (risos), pode acreditar. DVDs específicos dos instrumentos.
NA REDE
teclas & afins
junho 2015 / 11
INTERFACE
VOLTA AO PASSADO Em uma coletiva de imprensa realizada no Royal Festival Hall, o mundialmente famoso pianista e maestro Daniel Barenboim apresentou o piano especialmente encomendado por ele: o Barenboim-Maene Concert Grand. Depois de ver o piano do compositor Franz Liszt restaurado, em 2011, Barenboim ficou im pressionado pela diferença de sonoridade entre o instrumento do século 19 - com cordas paralelas - e os pianos de concerto modernos, que têm cordas cruzadas diagonalmente. “A transparência e as características tonais dos instrumentos de cordas retas são muito diferentes do tom homogêneo produzido pelo piano moderno. As vozes claramente distingu íveis e as diversas cores por toda a tessitura do piano de Liszt me inspiraram a explorar a possibilidade de combinar essas qualidades com a potência, a aparência, a uniformidade de toque, a estabilidade de afinação e outras vantagens técnicas dos modernos Steinway”, conta o músico. Da ideia surgiu a encomenda de um novo modelo, inspirado por instrumentos do século 19 e projetado por Chris Maene, que possui diferenças também na construção da tábua harmônica e na estrutura de metal. O pianista teve o cuidado de salientar que o projeto não tinha surgido da insatisfação de seu próprio Steinway (que também estava no palco): “Este piano tem perfil e som diferentes. É como com instrumentos de cordas. Algumas pessoas preferem um Guadagnini, outras um Stradivarius”. 14 / junho 2015
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Som de bolor O compositor brasileiro Eduardo Miranda mantém um dueto, no mínimo, insólito. Ao tocar as teclas do piano, os sons etéreos e distantes produzidos pelo instrumento surpreendem tanto pela inovação quanto pela forma de produção: em vez de silício, um biocomputador foi programado com pequenos organismos cultivados. “Tratase de um fungo, conhecido como bolor vimoso, que existe em zonas escuras e úmidas das florestas”, explica Miranda. Quando cultivado em placas de circuitos, o fungo consegue armazenar informação, como um chip, o que permite que seja programado para reagir à informação que lhe é transmitida. De certa forma, o bolor “ouve” o que o pianista está tocando e muda seu estado. Dependendo de qual seja esse novo estado, ativa-se um conjunto de notas, que são enviadas por cabos a vários eletroímãs instalados sobre as cordas do piano, que fazem que as notas toquem.
Adeus John Tout Morreu em 1º de maio, vítima de insuficiência pulmonar, John Tout, tecladista da banda Renaissance no período de 1972 a 1979. De formação erudita, Tout era um virtuose, preferindo o piano aos sintetizadores.
Além do metal Rikard Zander, o
tecladista da banda de metal sueca Evergrey, acaba de lançar o primeiro single de seu trabalho-solo. O álbum conta com participações de membros de bandas Evergrey e Avatarium e está musicalmente muito longe do metal que Rikard normalmente toca. “Obviamente tem mais teclados e menos guitarras, mas acredito que as pessoas que estão familiarizadas com meu trabalho irão reconhecê-lo”, diz Rikard. Usando o nome RIKARD Z, o músico se arrisca como cantor na faixa “The World Makes Sure You’ll Die”. teclas & afins
junho 2015 / 15
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PARABÉNS! 5
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Durante o mês de junho comemora-se o aniversário de várias personalidades ligadas ao mundo das teclas. 8
8
Martha Argerich (1941)
6
Mú Carvalho (1957)
Robert Schumann (1812)
9
Nick Rhodes (1962)
12
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Edgar Froese (1944)
9 Erroll Garner (1923) Kenny Barron (1943)
16 21 Jon Lord (1941) Chick Corea (1941)
20 22 Brandon Flowers (1981)
Laércio de Freitas (1941)
24
25
Ivan Lins (1945) 19
22
Hermeto Pascoal (1936)
25 Eumir Deodato (1942)
26 João Carlos Martins (1940)
28
Patrick Moraz (1948)
16 / junho 2015
David Paich (1954)
Dave Grusin (1934)
John Medeski (1965)
teclas & afins
RETRATO
Nilton Corazza
Quem sai aos seus... Único brasileiro a conquistar o Grammy, Ruriá Duprat exerce a profissão de produtor se dividindo entre trilhas sonoras, álbuns de sucesso e criação publicitária Pense em um músico brasileiro que conquistou um Grammy. E não estamos falando da versão latina, mas da americana, a original. Consegue imaginar em que categoria? Melhor Álbum de Jazz Contemporâneo. A façanha (inédita antes dele) é de Ruriá Duprat, produtor do disco Randy in Brazil , do trompetista norteamericano Randy Brecker, em 2009. Pianista, maestro, arranjador, compositor, produtor e diretor musical, Ruriá traz no sangue a linhagem de grandes músicos que ajudaram a construir a história da música brasileira. Filho de Régis e sobrinho de Rogério - um dos mais importantes nomes ligados ao tropicalismo - o músico coleciona outros feitos. Com 14 anos, baterista, fazia bailes em clubes do interior graças a uma autorizaçã o do juizado de menores. Com 16 anos, foi convidado para tocar piano com o Altemar Dutra e um ano depois, acompanhava Zé Rodrix e Belchior. Aos 19, a banda que mantinha com Marco Bosco, o Grupo Acarú, foi convidada pra tocar por seis meses no Japão. Adorados por lá, a carreira 16 / junho 2015
do músico se consolidou. Tocou com Sá & Guarabyra, entre outros artistas, produziu alguns discos, compôs algumas campanhas publicitárias e participou como tecladista em algumas bandas de rock como o lendário O Terço. Conseguiu uma bolsa de estudos na Berklee oferecida por Quincy Jones de maneira peculiar: “descobri que ele tinha um programa de bolsas de estudos dentro da Berklee”, conta Ruriá. “Na época, tinha 21 anos e resolvi escrever para Quincy Jones no endereço que estava na contracapa do Thriller - um dos maiores sucessos de Michael Jackson produzido por ele. Enviei alguns dos meus trabalhos dizendo que gostaria de estudar na Berklee, mas não tinha recursos pra pagar as mensalidades”. O famoso produtor respondeu, afirmando que havia gostado dos trabalhos e que estaria disposto a bancar os estudos de Ruriá na escola. Cinco anos depois, estava formado, mas não sem sustos. “Nas primeiras provas tirei A, A, A, A- e B+”, conta. “Estava superfeliz, até que me disseram: ‘não trabalhamos com B+ para bolsas aqui’. Tive que me dedicar ainda mais (risos)”. teclas & afins
RETRATO
Ruriá Duprat: carreira e conhecimento sólidos
z i u L o i b a F ©
teclas & afins
junho 2015 / 17
RETRATO
A conquista do Grammy: Randy Brecker e Ruriá Duprat
Depois de ter aprendido o que pode na Berklee e ter trabalhado como assistente de seu tio, Ruriá colecionou trabalhos de sucesso com músicos como Ed Motta, Flávio Venturini, Gilberto Gil, Stanley Jordan, Jane Monheit, Ray Lema, Carlinhos Brown, Chico Cesar, Lulu Santos e Lenine, entre outros. Como se não bastasse, trabalhou como Diretor Artístico e Regente da pianista Diana Krall na gravação do DVD Live in Rio. “Houve uma concorrência artística para realizar o projeto”, lembra Ruriá. “No fim, sobraram duas propostas e quem decidiu foi Diana Krall e Claus Ogerman. Acabei sendo escolhido justamente por meu perfil que reúne o erudito e o popular. Eles não queriam uma orquestra puramente erudita”. Nesse projeto, trabalhou tam bém com Tommy LiPuma e com o engenheiro Al Smith. 18 / junho 2015
Reconhecido e requisitado como um dos melhores compositores de trilhas sonoras, tanto para cinema quanto para TV, divide seu tempo com a criação para o mercado publicitário nos estúdios Banda Sonora, em São Paulo, do qual é proprietário. Atualmente, Ruriá trabalha sobre o próximo álbum de Ron Carter, lenda viva do Jazz, com a cantora brasileira Vitória Maldonado. O CD foi gravado com o Ron Carter’s Quartet, uma orquestra de aproximadamente 40 músicos e alguns convidados muito especiais como Roberto Menescal, o saxofonista Naylor Proveta, o acordeonista Toninho Ferragutti, o gaitista Omar Izar e o violista Alexandre de Leon, além do premiadíssimo trompetista norte americano Randy Brecker. Foi no Banda Sonora que Ruriá Duprat recebeu a reportagem de Teclas & Afins, o compositor Maurício Domene e a teclas & afins
RETRATO
pianista Rosana Giosa para uma conversa superagradável sobre produção musical, trilhas, teclas e muito mais. Leia alguns trechos a seguir e assista ao vídeo em nosso canal no Youtube. Como foi seu início na música?
Iniciei com violão. Foi meu comecinho, com 4 anos. Meu pai, Regis Duprat, era violista na Orquestra Sinfônica Municipal e minha mãe, Ruth Mayer, tocava violino. Depois fui baterista por vários ano s. Estudei piano com várias pessoas. Estudei com o Amilton Godoy e passei por diversos outros professores. Quando fui para a Berklee acabei aperfeiçoando mais. Mas não me considero um instrumentista espetacular, porque nunca me dediquei. Mas o que eu sabia foi o suficiente para fazer festivais de jazz pela Europa durante treze anos. A questão foi que abri demais meu leque, mesmo no começo. Comecei produzindo, depois arranjando também. Gostava de compor. Então não me dediquei ao piano como deveria.
que bateria não ia me levar muito longe. Eu tinha anseios harmônicos. Quando decidi tocar bateria, meu pai me disse: “se você quer tocar bateria, você vai estudar percussão sinfônica, onde a bateria está inserida, e estudar música direito”. Fui para a Escola Municipal de Música, fiz o exame e acabei passando. Fui estudar percussão sinfônica com o Ernesto de Lucca, que era o timpanista da Sinônica Municipal, orquestra em que meu pai tocava. Eu me desiludi. No começo, você faz exercícios com o metrônomo a 66 para o braço subir... exercícios para ansiedade. Praticamente um curso de autoajuda (risos). E eu querendo tocar batera como o Animal, dos Muppets. Piano complementar: estudei Hanon por três anos, querendo morrer. Cadê as músicas? Eu ouvia Genesis, Gentle Giant... Então estudava dois exercícios do Hanon e ia buscar as harmonias que ouvia lá. Com o tempo comecei a me divertir porque
Como foi que os teclados entraram em sua história?
Eu achei que como baterista não teria muito futuro, pois já tinha interesses de arranjador. Meu pai era musicólogo também, então o ambiente em casa era muito musical. A gente ouvia muita coisa, de bossa nova a Beatles, de Tchaikovsky a Boulez. Acabei conhecendo de Stockhausen a Fran Zappa. Havia muita coisa acontecendo, em pleno tropicalismo. Eu ia a casa do Rogério, que era muito próximo de meu pai, então estávamos sempre juntos. Lá estava Caetano, Gil, Gal, Tom Zé, Rita Lee, Mutantes, Betânia. Muita gente o tempo inteiro. As primeiras pestanas que aprendi no violão foram com o Gil. A coisa do teclado veio porque achei teclas & afins
Diana Krall: convite irrecusável junho 2015 / 19
RETRATO
o ã ç a g l u v i D ©
Banda Sonora: estúdio em que exibe os prêmios conquistados
conseguia tirar as harmonias do YES. Mas não tinha técnica para fazer aquilo, mas tirava, parava o cassete para entender. Chegou uma hora em que voltar para a bateria não tinha mais sentido. Meu primeiro trabalho profissional, com 15 anos, foi tocar com o Altemar Dutra. Uma virada total. E eu era o maestro, porque o pianista sempre é o maestro. Não sabia nada, só escrever uma cifra, fazer um ritmo etc. Até um dia em que fui fazer um show no Nordeste. Fomos Altemar, eu e o empresário. Chegando lá, a banda era superexperiente. Sabiam todo o repertório dele. Tocavam muito melhor que eu (risos). Eles foram se empolgando e eu fazendo coisas que eu nunca tinha imaginado que existiam. Eu era o maestro do Altemar e o baixista ficava me passando as cifras: Dó, Ré, Sol, baixo em Fá...(risos). E eu passei o concerto inteiro a reboque dos caras. Os teclados mesmo entraram na minha vida quando fiquei no Japão com o Grupo Acarú por seis meses. Ganhei muito dinheiro lá e torrei tudo em teclados para trazer para o Brasil.
As duas coisas. Ajudou muito, com certeza. O Rogério e o Regis tocaram na Municipal por mais de 15 anos. E eram muito queridos lá dentro porque eram defensores do bemestar da orquestra. Eram muito cultos. O Régis, com 14 anos, já havia lido todos os filósofos que você pode imaginar. E o Rogério também. Eles tinham um nível cultural um pouco acima da média para a orquestra e tomavam as dores do pessoal, reivindicando salários, condições de trabalho etc. Por um bom tempo cheguei a reger a Jazz Sinfônica e outras orquestras e encontrei ex-colegas de meus pais. No começo sempre tive uma força muito grande: “É filho do cara!”. Por outro lado, havia muita cobrança ta mbém. Você, Régis e Rogério ouviram todo tipo de música. Atualmente, faltam referências musicais para os artistas que querem entrar no mercado?
O cenário é preocupante. Fico pensando o que vem agora, depois do funk mirim. Nos anos 70 – sem saudosismo – a música era muito mais sofisticada. As melodias, as dinâmicas, que vão de pianíssimo O sobrenome Duprat ajudou ou atrapalhou? a fortíssimo, o contexto harmônico. 20 / junho 2015
teclas & afins
RETRATO
Aconteciam mil coisas, se mudava de andamento. Se trazem um alienígena de Saturno para cá, mostram um rock de hoje em dia, que está no mercado, e um rock dos anos 70, ele vai achar que este último é a evolução do rock de hoje (risos). Estamos vivendo uma “devolução” (risos). Música de dança, eletrônica, por exemplo, adoro! Mas confesso que me enjoa um pouco pela previsibilidade. Os timbres, também já ouvi quinhentas vezes. Vi o David Guetta esses dias no Tomorrowland – porque vejo todos. Não vou a todos, mas vejo todos. Não posso ficar fora. Mas, sinceramente, “put your hands up, put your hands up”, e as pessoas vibrando… Eu acho que elas podiam vibrar muito mais, porque as coisas estão extremamente previsíveis. Sem querer comparar, mas a música de dança da década de 1940 era muito mais sofisticada musicalmente e usava um percentual mu ito maior do que é música. Eles tinham menos recursos e buscavam criar coisas diferentes. Tinham a vontade de buscar sonoridades novas. O eletrônico tem uma gama de sons incrivelmente grande, mas se acomodou em um por cento do que existe. É sempre o High Pass Filter, o baixo eletrônico, som de batera sempre bumbo com kick. E olha que eu gosto, vou atrás, acho bacana. Eu sei que essas coisas funcionam. O Tommy Dorsey também funcionava, mas aí vem o Duke Ellington, fica inquieto com aquilo e diz: “gente, essa sonoridade já encheu! Vamos mudar um pouquinho?”. Existia uma inquietude maior do que a dos eletrônicos que têm uma gama infinitamente maior de timbres. Quem se acomodou foi o gosto do público. E isso está valendo para tudo. As pessoas não percebem que estão ouvindo a mesma musiquinha sempre. A função da música mudou, migrou para o entretenimento. teclas & afins
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KAWAI ND-21
Pianofatura Paulista – www.piano.com.br
O novo piano vertical desenvolvido pela K awai, o modelo ND-2 1, apresenta mecanismo de ultrarresposta e go lpe direto (Ultra‐Responsive Action), que proporciona excelente sensação e precisão no toque. Os ma rtelos são confeccionados com feltro de pura lã de alta qua lidade e foram redesenhados para proporcionar excelente entonação. As peças mais sujeitas à fadiga são p roduzidas com um composto de ABS Styran, que comprovou ser um material altamente resistente e estável, pois não sofre deformações com as mudanças climáticas. Com 121 cm de altura, 150 cm de largura e apenas 58 cm de profundidade, o ND‐21 traz tábua harmônica em S pruce maciço, quatro colunas de madeira, cravelhas e pedais niquelados e acabamento preto de alto b rilho. 22 / JUNHO 2015
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VITRINE
KORG KRONOS 2 Pride Music – www.korg.com.br
Lançado em 2011 e atualizado em 2013 com a versão X, o KORG Kronos chega agora à segunda geração. Com 61, 73 e 88 teclas, a nova versão oferece super fície de controle avançada com dois Joysticks (X-Y, Vector), controle Ribbon, oito knobs giratórios, nove sliders, 16 teclas iluminadas e mecanismo SGX-2 Grand Piano aprimorado, apresentando o novo piano Berlin Grand, além dos aclam ados German Grand e Japanese Grand. Samples sem looping gravados para cada tecla proporcionam decaimento natural e autêntico. A troca de camadas em velocity de 12 níveis excede os dados anteriores em 8 níveis e característic as de nuance adicionais como ressonância das cordas ao usar o pedal e dados de samples de “una corda” recriam cada detalhe da per formance de um piano de concer to. O Kronos apresenta nove mecanismos de som/sintetizador distintos em um único instrumento musical integrado. A alocação dinâmica de vozes e novas tecnologias permitem que estes mecanismos de som comp artilhem tranquilamente uma plataforma de hardware aprimorada e estável. Open Sampling System, gravação de áu dio em 16 pistas e sequenciador MIDI em 16 pistas, aliados a 16 processadores de e feitos internos e função KARMA complementam o workstation que ainda traz modo S et List com atualizações, Display Color TouchView com capacidade TouchDrag e Portas USB/MIDI para acomodar superfícies de controle MIDI (KORG microKEY, KORG NanoPad2 etc).
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JUNHO 2015 / 23
VITRINE
Ultimate VS-88
AlltechPro – www.alltechpro.com.br Quem esperava encontrar por aqui os aclamados produtos da Ultimate Support Systems já pode ficar feliz. A marca americana reconhecida em todo o mundo pela qualidade e durabilidade de seus suportes, já tem distribuidor exclusivo para o País. A AlltechPro, sediada em São José, no Estado de Santa Catarina, oferece desde suportes para amplificadores, guitarras e violões até carrinhos para transporte, passando pelos extremamente confiáveis e estáveis modelos para teclados, com destaque para o VS-88, muito conhecido entre os tecladistas profissionais.
Saindo da Garagem Música e Business
Rodrigo Kuster, Gabriel Machado e Vitor Durão
Editora Atlas Preço de capa: R$ 55,00 O livro se propõe a contribuir com todos que estão ligados, direta ou indiretamente, ao mercado da música. A obra é recomendada para artistas, compositores, técnicos, executivos e demais interessados em ter uma visão geral desse mercado, de seu nascimento até a atual “explosão” digital, entender a estrutura e os players deste universo e os modelos de negócio existentes, bem como como planejar estratégia, atuação e divulgação nesse segmento. Trata-se de uma obra ideal para quem compreende a necessidade de que seus atuais conhecimentos técnicos sejam complementados pelos saberes do mundo dos negócios. A proposta é que os conceitos explanados no livro acompanhem e estejam ao lado do músico no decorrer de sua trajetória, além de servirem como incentivo para que aprimore suas capacidades. A publicação aborda alguns dos conhecimentos essenciais que irão criar e fortalecer o lado business: Música como Negócio, Planejamento de Carreira, Marketing das Artes, Aspectos Econômicos, Aspectos Legais, dentre outros saberes imprescindíveis. 24 / JUNHO 2015
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VITRINE
GranDense GranDense
Independente O duo instrumental GranDense, formado pelo excelente tecladista Thiago Marques e o não menos competente baterista Ébano Santos tem como base peças autorais criadas e arranjadas unicamente para teclas e percussão, utilizando bateria, teclados, sintetizadores, pianos e (por conta da tradição gaúcha) acordeon (Gaita). Transitando por diferentes estilos, as músicas mesclam o rock instrumental com elementos eletrônicos, jazz, blues, heavy metal, com inserções de gêneros gaúchos. A descrição do release, na verdade, não faz jus ao som do duo. Bastam alguns segundos de audição para perceber que – finalmente – algo de interessante surgiu na cena musical. O som agrada tanto aos aficionados pelos estilos que formam esse amálgama quanto aos que buscam algo inovador, mesmo que baseado em elementos pré-existentes. Audição obrigatória! (Nilton Corazza)
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JUNHO 2015 / 25
materia de capa
NILTON CORAZZA
Eliane Elias: de volta às origens
n a m o l o S e p p i l i h P ©
28 / junhO 2015
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materia de capa
Made In Brazil Eliane Elias construiu uma sólida carreira internacional explorando de forma muito particular - como poucos se propõem a fazer - as confluências e as possibilidades da bossa nova e do jazz, representadas no disco que marca o retorno da artista ao estilo que a consagrou
O novo álbum de Eliane Elias atingiu o primeiro lugar em audições no iTunes e no Amazon.com e estreou em terceiro lugar na Billboard Traditional Jazz Chart, nos Estados Unidos. Também atingiu o topo em paradas da França, da Espanha e de Portugal. Nada mal para a paulistana que há mais de 30 anos mudou-se para Nova York. E, também, nada surpreendente. Desconhecida do grande público no Brasil, a pianista e cantora foi para os Estados Unidos, com 21 anos, para tocar teclas & afins
jazz. E fez isso tão bem que se tornou a primeira mulher instrumentista a ganhar uma capa da Downbeat, mais importante publicação do gênero no mundo. Com cinco indicações ao Grammy e quatro discos de ouro, ganhadora três vezes do prêmio de melhor disco vocal no Japão e primeiro lugar em vendas na França, com todas as gravações entre os top five na Billboard Jazz Charts, Eliane Elias conquistou definitivamente um lugar no rol dos gigantes da música. junho 2015 / 29
materia de capa
Eliane Elias começou a estudar piano erudito aos 7 anos, influenciada pela mãe Lucy, também pianista. Aos 12, transcrevia os solos de grandes mestres do jazz. Três anos mais tarde, era orientada por ninguém menos que Amilton Godoy, ícone da música brasileira que a influenciou de maneira indelével. A carreira profissional se iniciou aos 17, trabalhando com Toquinho e Vinícius de Moraes e no circuito de jazz, apresentando composições próprias. Após uma turnê em 1981 com o baixista Eddie Gomez, foi encorajada a se mudar para Nova York, onde continuou seu aperfeiçoamento na Juilliard School of Music. Surgiu então o convite para se juntar à banda Steps Ahead, ao lado de Mike Mainieri, Michael Brecker, Peter Erskine e Eddie Gómez. Seu primeiro álbum foi uma colaboração
intitulada Amanda, em 1984, com Randy Brecker, com quem se casou. Pouco tempo depois começou sua carreirasolo, assinando com a Blue Note Records e lançando o álbum Illusions , de 1987, com Steve Gadd e Stanley Clarke. No ano seguinte, foi eleita Melhor Novo Talento em Jazz pela revista Critics Poll. Na sequência vieram Cross Currents , com Eddie Gomez e Peter Erskine, e So Far So Close , produzido por Eumir Deodato. Foi indicada pela primeira vez ao Grammy em 1995, pelo álbum Solos and Duets , gravado com Herbie Hancock. De lá para cá, Eliane, cada vez mais, adicionou canções brasileiras a seu repertório, notadamente da bossa nova a lém de suas próprias composições, criando o estilo que a consagrou e influenciou artistas do porte de Diana Krall.
o n a i r a M o y g a r l a u o m z a A C l a e i v n a l F D ©
Eliane Elias: inspiração para Diana Krall 30 / junhO 2015
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Made In Brazil marca o retorno da pianista a
esse estilo que a consagrou, que mistura as raízes brasileiras e sua voz sensual e atraente com o jazz instrumental consistente e suas habilidades de composição. O álbum tem repertório dividido por meia dúzia de composições autorais (criadas há dois anos, durante as férias em São Paulo) e outro tanto de clássicos da MPB, como “Aquarela do Brasil”. Gravado em São Paulo e com participações de artistas como Roberto Menescal, Ed Motta, Take 6, Amanda Brecker e a Orquestra Sinfônica de Londres, o álbum apresenta as várias facetas da pianista/cantora, que atuou também como arranjadora, compositora, letrista e produtora. Conversamos com Eliane Elias, que nos contou um pouco mais sobre o disco e o mercado fonográfico atual. Qual foi o conceito que norteou a produção desse álbum dedicado ao Brasil?
Esse álbum traz um pouco da história de nossa música, começando com Ary Barroso, passando por Tom Jobim e Menescal, e com minhas composições, que são mais contemporâneas. A ideia foi gravar no Brasil. É a primeira vez que gravo no Brasil desde que me mudei para Nova York, em 1981. Foi uma gravação especial para mim.
n a m o l o S e p p i l i h P ©
Estilo: cosmopolita com toques tropicais
imaginei. As músicas retratam exatamente o que pensei. Made In Brazil é um álbum feito nos moldes de superprodução, prática não tão comum nos dias de hoje. Por que essa opção?
O que faço musicalmente e a opção que faço de produção são baseados no que imagino, no que eu espero escutar em cada uma das músicas e dos arranjos. Podendo, ou seja, estando em uma situação em que eu possa fazer o que fiz - ter orquestra, Você acumulou várias funções na produção cordas adicionais etc -, é claro que vou desse álbum: pianista, cantora, arranjadora, atrás do som que imagino. produtora etc. Como é atuar em diferentes frentes? Quais as dificuldades e as vantagens nesse tipo de trabalho?
Como foi feita a escolha do repertório não inédito?
Em todos os meus álbuns trabalho em várias frentes. A dificuldade é que tenho que trabalhar demais, usar muitos chapéus (risos), tomar conta de muitas coisas, de muitos aspectos da gravação. A vantagem é que o resultado sonoro é o que eu
Foi feito de forma orgânica. Existe um material muito vasto, uma grande quantidade de músicas que tenho vontade de tocar, cantar e gravar. Depende muito do momento em que estou selecionando o material, criando a ideia da produção, do
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junho 2015 / 31
materia de capa
n o s n e f l o W b o B ©
Mais que marketing: classe e beleza a serv iço da música
álbum. Aí, as músicas vão vindo. É claro, que estando no Brasil, no nosso clima, escutando nosso idioma, a coisa foi puxando mais para o Brasil e para certas músicas que eu tinha vontade de fazer, como “Você”, “Aquarela do Brasil”, “Tabuleiro da Baiana”, “Águas de Março”. Mas fazer como idealizei.
álbum traz o lado mais tradicional de nossa música, samba exaltação e bossa nova. “Vida” e “Driving Ambition” trazem o que chamamos de straight eight notes, em uma mistura com backbeat. Mas ainda tem elementos da bossa nova. Antes de gravar “Vida”, telefonei para Ivan Lins. Disse a ele: “Ivan, que tal uma música que acabei de “Vida (If Not You)” e “Driving Ambition” fazer que deveria ter sido sua? !”. Roubei a parecem apresentar uma abordagem frase que Jobim disse a alguém (risos). É um tanto diferente da música brasileira uma música que tem aquela levada, aquela em comparação com as demais faixas do coisa de Ivan Lins. Ele é uma pessoa muito álbum. Quais foram as influências atuais querida, um músico com o qual tive a da música brasileira que te inspiraram oportunidade de trabalhar por várias vezes. Apesar de ter a participação de Ed Motta, nas composições do disco? A música brasileira, como tudo, tem acho que “Vida” vem da inspiração daquela passado por uma transformação. Este época de Ivan Lins, o que é maravilhoso. 32 / junhO 2015
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materia de capa
Então, tem a ver com a música brasileira, mas não só com a bossa nova e o samba, mas com outro aspecto de nossa música. “Driving Ambition” também. Não que tenha a ver com Ivan Lins, mas com o backbeat misturado com bossa nova e com uma levada tipo calango, uma coisa interessante misturada com ritmo brasileiro. Um calango bem mais lento, mas com aquela antecipação do contrabaixo com a bateria que pode levar as pessoas a pensarem que tem mistura com música latina também. Nesse disco há menos ênfase na improvisação e mais nas melodias e nos arranjos. Por que essa escolha?
Foi minha intenção. Este não é um disco de jazz. É o 25° disco que faço e cada um tem sua história, sua intenção. A intenção deste era o de trazer essas músicas e mostrar esses arranjos. Ainda há momentos de improvisação, mas são mais curtos. Estou em uma fase de minha vida, já há alguns anos, em que acredito que essas improvisações de cinco chorus, hum... Acredito que consegui me especializar em entregar a mensagem em um chorus apenas, se for o caso. Uma coisa que sempre quis fazer é poder contar uma história naquele chorus. Não preciso ficar cinco ou seis chorus improvisando. Isso se torna mais agradável para o ouvinte e me dá oportunidade de fazer mais músicas em vez de fazer músicas tão longas com tantas improvisações.
A presença de um cast de notáveis músicos brasileiros foi para oferecer o “sabor” daqui ao público internacional ou se deveu à necessidade de ter gente ambientada aos ritmos? Ainda há dificuldade de músicos de fora daqui, notadamente os americanos, de reproduzirem a rítmica brasileira?
A rítmica brasileira não é representada ou reproduzida por americanos nem por músicos de lugar algum do mundo. Nossa autenticidade continua vindo do Brasil, com os brasileiros, especialmente quando se fala de instrumentos como violão, piano e bateria. No contrabaixo. tenho o Marc Johnson. Não existe outro contrabaixista acústico que eu possa imaginar fazendo o que ele faz. Porque ele não é somente um virtuose, mas traz aquela conversação, aquele diálogo do jazz, ainda mantendo os ritmos brasileiros. Johnson trabalha comigo há mais de 25 anos. Fora ele, não conheço nenhum músico estrangeiro que tenha esse suingue, especialmente quando falamos de instrumentos rítmicos e harmônicos como piano e violão. É diferente em instrumentos-solo como o trompete, que podem tocar sobre o ritmo.
Jazz e bossa nova têm muitas interseções e até mesmo se influenciaram mutuamente. Para uma pianista que já trafegou por várias linguagens, essa ligação ainda é muito forte?
Claro. Minha raiz é brasileira. O Jazz é fortíssimo dentro de mim. Essa interseção sempre vai existir. teclas & afins
junho 2015 / 33
materia de capa
Em Made In Brazil, você utilizou tanto o piano acústico quanto o Fender Rhodes. Como foi isso?
com improvisações e com seus solos. É um show muito interessante.
Escolhi onde usar de acordo com cada música, com o som que tinha em mente. Não tenho usado Fender Rhodes por anos. Fazia tempo que não usava keyboard, teclado algum em gravações e shows. Mas, neste disco, achei bonito usar essa cor.
O mercado fonográfico está em crise há alguns anos. Qual sua opinião a respeito da distribuição digital de música? Como esse processo influencia na carreira de ar tistas e, principalmente, de instrumentistas?
A bossa nova ainda é o principal produto musical da exportação do Brasil e o estil o que melhor o caracteriza para o público mundial? O que o público americano conhece hoje de música brasileira?
Falo não só de público americano, mas também de europeu. Eles conhecem Jobim e alguma coisa de Ary Barroso, por causa dos filmes de Walt Disney. Mas amam muito nosso ritmo e nossa harmonia, principalmente a beleza da música brasileira da época da bossa nova. Faço em média 220 dias de turnê por ano e levo nossa música para o mundo inteiro, juntamente com o jazz. Por conta disso, me tornei um nome importante em termos de representação dessa mistura de música brasileira com jazz. Faço um tratamento especial nos arranjos das músicas que entrego, que dão a chance para os instrumentistas, a pianista que sou e os virtuoses que trabalham comigo, também poderem se destacar
Está em crise, sim. Os CDs não vendem como antes. Mas, nem a música digital. As pessoas fazem streaming no Spotify e no Youtube e escutam o que querem no momento que querem. Para os músicos, é necessário sair e tocar ao vivo. Então, as pessoas que são capazes de criar álbuns porque contam com as enormes facilidades que os softwares oferecem, como refazer gravações, afinar as vozes, arrumar os solos, podem fazer um disco. Mas, como é preciso sair e tocar ao vivo... A prova fica aí. O que acaba sobrevivendo é o músico que realmente pode se apresentar ao vivo, que tem a capacidade de tocar tanto em gravações quanto no palco. Os que criam músicas que são boas para vender discos, tudo arrumadinho, feito de forma, às vezes, com todos os recursos da tecnologia, não vão viver da venda desses álbuns. O músico tem que estar apto, ter a capacidade de trabalhar ao vivo, para ser querido, ser chamado, contratado e poder apresentar seu trabalho.
NA REDE y a l u o z A l e i n a D ©
34 / junhO 2015
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SINTESE
POR ELOY FRITSCH
A recriação dos sintetizadores modulares A Moog Music está relançando os instrumentos clássicos da época de ouro da música composta para sintetizador - os modulares System 35, System 55 e o Model 15 - nos quais os engenheiros trabalharam quase que artesanalmente na recriação dos dinossauros analógicos, utilizando os projetos originais dos sintetizadores para fabricar as novas placas de circuito impresso
Os sintetizadores digitais possuem antepassados “pré-históricos”, gigantes, cheios de fios, com muitos botões, monofônicos, complicados e caros, que, nas mãos de grandes tecladistas, colaboraram na construção da história da música moderna. Os modulares pareciam centrais telefônicas antigas e era preciso conectar cabos para efetuar as ligações entre os vários módulos geradores e transformadores do som. Os fabricantes de instrumentos eletrônicos
Moog System 55: 55 módulos 36 / junho 2015
desenvolveram os sintetizadores modulares comerciais principalmente na década de 1970, com o surgimento dos primeiros Moogs e Buchlas. Outras empresas lançaram modelos similares como Roland System100m e System-700; Korg Ms-50; ARP 2500; E-mu Modular; Serge Modular; PPG 100, 200 e 300; Polyfusion; e Aries Modular. Vários músicos utilizaram os dinossauros modulares. Dentre eles, Hans Zimmer, Vince Clark, Herbie Hancock, Frank Zappa, Steve Roach, Wendy Carlos, Jean Michel Jarre, Isao Tomita, Vangelis, John Cage, Hideki Matsutahe, Dick Hyman, Johan Timman, Larry Fast, Jan Hammer, Suzanne Ciani e Morton Subotnick. Vale lembrar que o “showman” e tecladista Keith Emerson, para delírio dos roqueiros brasileiros, trouxe seu Moog Modular (que parecia o painel da nave U.S.S. Enterprise) na última tu rnê que fez com a banda de rock progressivo Emerson, teclas & afins
sintese
Aniversário: 50 anos de Moog Modular
Lake & Palmer por aqui. Apesar dos sintetizadores portáteis serem mais práticos e populares, os dinossauros modulares ainda são utilizados e cobiçados pelos tecladistas por causa da quantidade de sons que podem produzir e a qualidade dos timbres. Atenta a isso, a Moog Music está relançando os instrumentos clássicos da época de ouro da música composta para sintetizador: os modulares System 35, System 55 e o Model 15. Recriação A Moog Music já havia criado a réplica do sintetizador modular de Keith Emerson e lançado no festival Mogfest em 2014, em comemoração aos 50 anos do equipamento. O primeiro modular do tecladista do ELP foi fabricado em 1970 e tinha 81 módulos, sendo que 12 deles eram únicos. Foi o primeiro sintetizador dessa linha com presets para performance, já que era usado nas turnês do grupo inglês. A recriação feita em 2014 possui os mesmos teclas & afins
81 módulos, construídos manualmente e soldados de acordo com os esquemas originais e orientações dos manuais de serviço. A experiência de trabalhar nos esquemas originais do sintetizador de Keith Emerson possibilitou a fabricação da linha de sintetizadores modulares Moog usada nos anos 1970 por grupos de rock progressivo, jazz e disco. O número do sistema Moog informa a quantidade de módulos de síntese disponíveis em cada modelo. Por exemplo, o Moog System 55 é constituído por 55 módulos. A Moog está disponibilizando também alguns componentes impor tantes para estes modelos de sintetizadores, que são comercializados separadamente. E ntre eles está um teclado de cinco oitavas, um sequenciador e o 960 Sequential Controller para os modelos 35 e 55. Dick Hyman, autor do clássico álbum The Electric Eclectics of Dick Hyman (1969), foi chamado pela Moog Music para ser um dos artistas a experimentar as réplicas de sintetizadores da Moog.
Moog recriado: o engenheiro Herb Deutsch e o modelo de Keith Emerson junho 2015 / 37
SINTESE
Dick Hyman: o original e o novo Moog System 55
Switched-on Bach: época de ouro dos sintetizadores comerciais norte-americanos
O surgimento dos sintetizadores Moog O Dr. Robert Moog foi u m personagem de grande importância no desenvolvimento do sintetizador e da música eletrônica. Nascido em Nova York, no ano de 1934, Moog, por meio dos equipamentos que desenvolveu, revolucionou o som e o papel dos tecladistas. Seus inventos mudaram o curso da história da m úsica e permitiram que o sintetizador e a música eletrônica assumissem impor tante papel. Os primeiros contatos com a música vieram desde a infância, quando Moog estudou piano. Na adolescência passou a construir Theremins. Em 1957, graduouse Bacharel em Física no Queens College, Bacharel em Engenharia Elétrica na Universidade de Columbia e PhD em Engenharia Física na Universidade Cornell. Em 1954, fundou a R. A. Moog Company projetando e construindo, junto com sua esposa, instrumentos eletrônicos em um pequeno apartamento. A empresa cresceu, vindo a tornar-se um negócio lucrativo no ano de 1964, quando lançou
no mercado uma linha de equipamentos de síntese sonora.
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A ascensão dos sintetizadores Moog Em 1968, Wendy Carlos gravou o álbum Switched-On Bach, onde executou obras de Bach com o sintetizador modular Moog. O sucesso do álbum fez que a demanda desses instrumentos aumentasse consideravelmente. Bob Moog iniciou então a criação de sintetizadores portáteis. Construiu os Minimoog modelos A, B, e C, mas somente o modelo D obteve grande sucesso comercial. O Minimoog se tornou o sintetizador monofônico mais popular dos anos 70, tendo vendido aproximadamente 13.000 unidades entre os anos de 1971 e 1982. Antes da invenção desse equipamento, os sintetizadores modulares eram grandes e pouco práticos. O Minimoog foi o primeiro sintetizador portátil de sucesso, disponibilizando uma espécie de minilaboratório de música eletrônica para ser levado ao palco. Além disso, serviu como base no desenvolvimento dos teclados teclas & afins
sintese
posteriores. Em 1972, o nome da empresa de Moog mudou para Moog Music, Inc., e, dois anos depois, a companhia tornou-se uma divisão da Norlin Music, I nc., que ainda lançou alguns sintetizadores utilizando o nome Moog até fechar em 1987. Alguns dos principais sintetizadores Moog lançados na década de 1970 e 1980 foram: Liberation, Memorymoog, Micromoog, Minimoog, Minitmoog, Modular, Multimoog, Opus-3, Polymoog, Polymoog Keyboard, Prodigy, Concertmate MG-1, Rogue, Sanctuary, Satellite, Sonic Six, Source, Taurus. Robert Moog foi o presidente da Moog Music até 1977. Após sair da empresa que carregava seu nome, recomeçou a projetar e construir instrumentos em uma nova companhia, a Big Briar. A especialidade dessa empresa era o desenvolvimento de Theremins, porém, no ano de 1999, a empresa passou a desenvolver também pedais analógicos de efeito. Ainda em 1999, Moog desenvolveu, em parceria com a Bomb Factory, os primeiros efeitos digitais baseados nas tecnologias dos
equipamentos Moog em forma de plug-ins para o software Pro Tools. O Minimoog Voyager Em 2002, Robert Moog reabriu a Moog Music e produziu uma nova versão para o seu bem-sucedido Minimoog, o Voyager. Trata-se de um sintetizador analógico monofônico fabricado com a intenção de reproduzir o som do autêntico M inimoog. O instrumento possui funções adicionais ao original como rotinas de modulação, MIDI, superfície sensitiva ao toque e capacidade de armazenar e recuperar patches. Possui 44 teclas, três osciladores analógicos estáveis, dois filtros Moog (VCF), LFO, VCA e ADSR. A edição de aniversário do Minimoog Voyager ainda possui um novo banco de presets criados por tecladistas usuários do equipamento, entre os quais Rick Wakeman. O Minimoog Voyager ainda pode ser programado por meio de um software para a edição de todos os parâmetros de síntese, tanto na plataforma Mac quanto
Minimoog Voyager: versão atualizada do clássico teclas & afins
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SINTESE
Moog Theremin Polyphonic: produto inovador
PC. O editor permite carregar e salvar sons individuais bem como atualizar a versão do sistema operacional. Além disso, dispõe de um gerenciador para o banco de sons e a biblioteca de patchs por categorias de som, sensibilidade a mudanças no painel, gerador randômico de patchs com as funções de morphing, mixing e mutating form. A função Genetic possibilita que novos presets sejam obtidos pela modificação de dois presets em conjunto. O Minimoog Voyager possui as versões Electric Blue, Rackmount, Performer, Signature e Aniversary. Cada uma delas possui um detalhe diferente, principalmente
Moogfest Moogfest é o festival em homenagem a Bob Moog que ocorre em Nova York reunindo grandes tecladistas e músicos da cena eletrônica que utilizam instrumentos Moog. Por este festival já passaram nomes como Keith Emerson, Eumir Deodato, Jordan Rudess, Rick Wakeman, Suzanne Ciane e Gherson Kingsley.
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em relação ao painel e a outras características como o número de presets, as cores e a função do potenciômetro do mixer externo para a escolha dos presets. O Minimoog Voyager Rackmount é o modelo de sintetizador sem o teclado. Mesmo assim possui todas as funções de síntese do Minimoog Voyager podendo ser completamente controlado via MIDI. O Rackmount, assim como as mais recentes versões do Voyager, permite utilizar sete bancos de 128 presets. Robert Moog veio a falecer, aos 71 anos, no dia 21 de agosto de 2005, em Nashville, Carolina do Norte. A Fundação Bob Moog foi criada para servir como memorial e com o objetivo de continuar o trabalho desenvolvido por ele na área da música eletrônica, contando com a colaboração de vários músicos. A Moog Music continuou o trabalho pioneiro de seu fundador e desenvolveu outros instrumentos interessantes além dos sintetizadores. Entre eles estão os novos modelos de Theremin como o Theremini e o Theremin Polyphonic.
Eloy F. Fritsch Tecladista do grupo de rock pro gressivo Apocalypse, compositor e professor de música do Instituto de Artes da UFRGS onde coordena o Centro de Música Eletrônica. Lançou 10 álbuns de música instru mental tocando sintetizadores, realizou trilhas sonoras para cine ma, teatro e televisão. teclas & afins
ANOS DEPOIS, ELE RESSURGE! O LENDÁRIO SYNTH ANALÓGICO QUE TRANSFORMOU SUA GERAÇÃO.
KORG.COM.BR
livre pensar
POR ALEX SABA
O Arquiteto O álbum do Quaterna Requiem mantém a tradição do grupo de misturar, com maestria, a música clássica com o rock, sem a pieguice de ter uma orquestra por trás, mas soando como uma poderosa sinfônica com muitos timbres sutis e explosões harmônicas e melódicas Estava sentado no escritório do estúdio, tentando não esbarrar na estante, datilografando alegremente esta coluna, quando Sevé (o “Faz Tudo” aqui do estúdio) esticou o olho da poltrona onde ele tirava
um cochilo, interrompido pelo barulho da máquina de escrever, e leu o que eu começara a escrever. Esticou as pernas e quase me derruba da cadeira. Entre um bocejo e outro, e ainda esticando os
Quaterna Requiem: Kleber Vogel, Roberto Crivano, Elisa Wiermann, Claudio Dantas e Jorge Mathias 42 / junho 2015 2014
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livre pensar
braços - como se aquele cômodo pouco maior que uma cabine telefônica inglesa comportasse tanta folga - reclamou: “Vai escrever sobre outro gringo?”. Arranquei o papel da máquina e jogu ei na lata do lixo, que ele deveria ter esvaziado na semana anterior. “O que você sugere?”, perguntei. Ele levantou e saiu para a sala de bateria, onde sabia que poderia continuar a cochilar sem que o barulho o atra palhasse, mas antes disse: “Sei lá!”. Fiquei ali sentado, olhando pela janela para a parede do prédio em frente, uma muralha de concreto muito sem graç a sem nenhuma janela para fofocar, e me senti enclausurado. Por algum motivo, lembrei das histórias da Catedral de Notre Dame, do Quasimodo e, por asso ciação de ideias, do Quaterna Requiem. Faz tempo que não tenho notícias deles. Pedi uma entrevista para Elisa Wiermann que, apesar de ter concordado, anda meio sumida. Dei uma olhada na estante e lá estava ele, o último disco do grupo: O Arquiteto. Talvez Sevé esteja certo e seja hora de falar um pouco do que poucos conhecem. Essa coluna é mesmo para isso, chamar a atenção para aquilo que não a recebe. Eu já tinha pensado em escrever sobre esse disco, mas estava com medo de abordá-lo e a esse tema que escolheram, por alguns motivos. O maior deles é o fato de também ser arquiteto daí as implicações que comentar uma obra dessas traga. Mas deixando meus medos de lado, vamos nessa. O álbum
A capa é primorosa, característica da banda. Assim que o disco começa a girar, surge nas caixas o piano de Elisa abrindo “Preludium”, uma composição climática e perfeita para dar início aos trabalhos. teclas & afins
Não é daquelas que vai tocar no rádio por conta dos seus mais de 11 minutos, mas esse tempo é bem aproveitado para entrarmos no clima de O Arquiteto. Aos 4:15 surge a bateria de Claudio Dantas com uma marcha, acompanhando a guitarra de Roberto Crivano, que alternase com o violino de Kleber Vogel (que já havia aparecido durante a primeira parte de “Preludium”). A guitarra de Crivano vai bem chorosa, até que,por volta dos 6 minutos, o clima muda completamente pra o velho e bom rock (progressivo, bem entendido) com uma levada mais leve, tirando-nos de uma certa opressão que a introdução nos colocou. É um momento para respirar, com solos de Elisa, Vogel e Crivano. Até agora você poderia me perguntar: “ora, falta alguém?” Não é que falte. Não falei do Jorge Mathias (baixo) porque ele está onde deveria estar, lá no fundo, ou lá embaixo, nas suas frequência s graves dando suporte aos três solistas junto de Dantas. O clima cresce e a música se desdobra. Ouvimos influências leves de Rick Wakeman na técnica de Elisa e o final junho 2015 2014 / 43
livre pensar
se aproxima, climático e dramático - como se poderia esperar -, mas preparando a entrada de “Mosaicos”. A segunda música começa também climática. Gotas, chuva, névoa? Tanto faz. O piano de Elisa serve de base para o violão do convidado Phil Wiermann, coautor dessa faixa com Elisa, que assina todas as outras. O som do violão é lindo. Ótimo trabalho do engenheiro Renato Gomes do Estúdio Hyt. Cordas e piano são a cortina para o solo de Wiermann, com alguns toques percussivos no violão (ou seria Dantas, discretíssimo, lá por tr ás?). Finda a bela “Mosaicos”, um imponente órgão de tubos abre “Fantasia Urbana” ao lado do violino de Vogel seguido discretamente pela guitarra de Crivano, mas logo com a companhia de Dantas e Mathias. Uma peça complicadinha, que me fez parar para pensar qual seria a divisão dela. Mas isso era somente a introdução. Já aos dois minutos, algo muda e essa parece ser a tônica dessa peça de quase 12 minutos. Crivano abusa de “chorar” sua guitarra - fantástico ouvir alguém com emoção e não uma máquina de tocar notas atrás de notas. A dobra com o violino de Vogel é pura emoção. Guitarra e violino alternam-se mostrando talento e harmonia. Aos cinco minutos e pouco, a peça muda outra vez e Vogel improvisa sobre um tema em 6/4 (agora sim, eu contei). Solo de Elisa com um possível herdeiro do saudoso Minimoog e “Fantasia Urbana” se transforma em algo perto de um xaxado. Não me levem à mal. Não é pejorativo, nunca, em se tratando dessa banda. As bandas nacionais costumam esquecer o país em que vivemos. Mathias aparece mais aqui. Não está só lá atrás. Vem algumas vezes à frente pra nos preparar para outra mudança. Crivano, com um 44 / junho 2015 2014
Elisa Wiermann: composição e alma
longo sustain, do tipo de Latimer, logo é alcançado por Vogel. Pausa (minha).
Se essa peça é tremendamente complexa, começo a me preocupar (no bom sentido) com o que vou encontrar na “Suite O Arquiteto”, dividida em sete partes fora os quatro interlúdios. Fim da pausa.
O tema fica familiar novamente pra preparar o final, mas o andamento é discretamente crescente, preparando u ma possível explosão, vinda das constantes viradas de Dantas. É muito suspense, mas um ralentando mostra qual o caminho escolhido pela compositora pra encerrar. Passamos para a “Suite O Arquiteto”, que começa sem muitas delongas com o mesmo órgão imponente ao fundo, teclas & afins
livre pensar
guitarra e violino à frente e Mathias tão discreto no baixo quanto Dantas (se é ele que está nos sinos ou Tubular Bells). Cada movimento da suíte é dedicado a um arquiteto: “Bramante” (Donato di Angelo del Pasciuccio, renascentista 144 4 a 1514); “Mansart” (François Mansart, um dos criadores da arquitetura francesa clássica, Paris, 1598 a 1666 ou Jules Hardouin-Mansart, o ápice do barroco na França, principalmente pelo palácio de Versailles, 1646 a 1708); “Frank Lloyd” (Frank Lloyd Wright, arquiteto, escritor e educador, 1867 a 1959); “Gaudi”(Antoni Placid Gaudí i Cornet, arquiteto catalão, um dos símbolos da cidade de Barcelona, arquiteto de novas concepções plásticas ligado ao modernismo catalão - variante local da art nouveau -, 1852 a 1926); “Niemeyer” (Oscar Ribeiro de Almeida Niemeyer Soares considerado uma das
figuras-chave no desenvolvimento da arquitetura moderna, 1907 a 2012) são as cinco primeiras partes. “Descronstrução” e “Postludium” completam a obra. O que é muito legal nesse álbum é que ele mantém a tradição do grupo de misturar com maestria a música clássica com o rock. Não é a pieguice de ter uma orquestra por trás, mas ser a própria orquestra. As composições da Elisa tratam o grupo como uma pequena orquestra. Não são um quarteto de cordas ou uma orquestra de câmara, mas uma poderosa sinfônica com muitos timbres sutis e explosões harmônicas e melódicas. A essa altura, acho que meu FT (faz tudo) ficará satisfeito. Não que eu deva explicações a ele, mas a ideia foi boa, mesmo sem a entrevista com a Elisa. Quem sabe eu a convenço e trago os detalhes dos bastidores? Me aguardem.
Quaterna Requiem: emoção e intelecto teclas & afins
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vida de musico
por ivan teixeira
O que fazer para manter-se em forma Na música, é preciso praticar muito para obter bons resultados e a técnica precisa ser apurada para conseguir executar trechos de alto grau de dificuldade com clareza e beleza
Atletas precisam manter a forma. Seus desempenhos dependem disso. Todos os dias acordam cedo, fazem alongamento, correm, saltam, nadam, levantam peso. Mantém vida saudável e praticam seus respectivos esportes todos os dias, durante horas. É o que os fazem melhorar as suas marcas. Participei de um programa de televisão em que um medalhista brasileiro revelou que os nadadores escrevem nas portas de seus armários o tempo que almejam cumprir naquela determinada prova. Os campeões do vôlei acordavam mais cedo do que os novatos para o treino, porque sabiam que
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o jogo se ganhava ali, todos os dias no treinamento. A música não é competitiva dessa forma, pois não existe nenhum troféu esperando o artista depois de uma bela apresentação. De qualquer forma, a exigência que o corpo faz é praticamente a mesma. Duvida? Um sério estudo realizado pelo cientista Aaron Williamon, em Londres, concluiu que o desgaste de um pianista em um show é o mesmo de um atleta de alto rendimento como um maratonista. Interessante não? Imagine agora o seu desgaste, sem uma preparação de técnica
teclas & afins
vida de musico
adequada. Quantos pianistas que você conhece têm alguma “ite” (que é uma terminação para indicar inflamação) como tendinite, bursite, artrite etc. Alguns atletas, não treinam e são excelentes. São gênios. Duram menos, é verdade, assim como os pianistas sem treinamento técnico. Mas ainda sim, são exceções. Na música, não é diferente. É preciso praticar muito para obter bons resultados. A téc nica precisa ser apurada para conseguir executar trechos de alto grau de dificuldade com clareza e beleza. Se você é uma exceção e não precisa nada disso, eu não sei. Mas, se você precisa praticar pelo menos todos os dias, ou quer começar a praticar, deixo aqui algumas dicas: 1. Estude livros de técnica de piano erudito. O estudo do piano existe há mais
de 300 anos. Os clássicos detém pesquisa cuidadosa para uma técnica que possibilita tocar qualquer estilo musical existente. Os melhores métodos para adquirir velocidade, força ou leveza, são estudos da escola clássica de piano, como Pozzoli, Czerny, Hanon etc.; 2. Exercite escalas e arpejos para aperfeiçoamento da velocidade das mãos. Execute as escalas maiores, nos sentidos ascendente e descendente, com as duas mãos simultaneamente e com divisões rítmicas diferentes: tercinas; colcheias; colcheia e semicolcheia (sincopa); semicolcheias. Faça isso também com as pentatônicas; 3. Faça alongamento de ombros, braços, mãos e dedos. Da mesma forma que um
tecladista precisa aquecer as mãos antes de começar a tocar; 4. Todos os médicos (inclusive meu próprio pai) recomendam que façamos alguma atividade física. Mas evite
esforços físicos demasiados, que envolvam força nos punhos ou risco de lesão nos dedos. Musculação deve ser feita com muita cautela, porque o enrijecimento demasiado na musculatura dos ombros e pescoço pode causar certa “amarração nos braços”, fazendo que se perca a leveza e a coordenação motora fina, tão importante para tecladistas e pianistas. Para adquirir mais técnica, você terá que se dedicar ao instrumento. Não existe fórmula mágica e (ainda bem) nunca haverá. Dedicação ao instrumento significa tempo e continuidade. A persistência nos estudos será recompensada na qualidade do seu som. Quem estuda sabe essa diferença só de olhar para o pianista sentado em frente ao piano. Para quem tem interesse em estudar, mas acha que tem pouca disponibilidade de tempo para isso, sugiro que desenvolva uma agenda na rotina de seu dia a dia. Uma proposta “pé no chão”, que seja possível, para que funcione além mais da primeira “semana da empolgação“ e depois fique esquecida. Ache um horário específico para estudar. Meia hora por dia? Uma hora por semana? Não sei qual é o tempo que você tem disponível, mas faça que esse tempo de estudo para praticar jamais diminua. Se possível, aumente-o.
atleta precisa fazer aquecimento antes de entrar em uma partida, um pianista/ Ivan Teixeira Pianista de formação erudita, tecladista por sua própria escolha, Ivan Teixeira é proprietário da produtora de áudio IMUSI, produzindo, compondo e arranjando diversos projetos para cantores, cinema, publicidade e games. Trabalha com nomes importantes da música brasileira e tem sua própria carreira e seus discos gravados. Adora história da música, sintetizadores digitais, analógicos e virtuais. teclas & afins
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PALCO
POR WAGNER CAPPIA
Estrutura tecnológica A tecnologia existe, é abundante e altamente acessível nos dias atuais, e deve ser usada em toda a sua capacidade, mas encontrar a medida certa é uma tarefa nem sempre simples
Na edição anterior falei sobre o abuso no uso da tecnologia musical. Muitos artistas, na ânsia de criar um projeto grandioso, confundem “grandioso” com “exagerado”. Aplicam uma infinidade de recursos técnicos em seus registros e, em um show, se tornam escravos de samplers e clicks, deixando o controle por conta da máquina atrás do palco. No início de minha carreira, quando compunha as músicas para um projeto, o foco era apenas a mensagem - o que dizer com a música - e não economizava em notas e harmonias não convencionais para tentar transmitir tudo o que estava em minha cabeça. Com o tempo, percebi que
a mensagem estava chegando apenas para mim e não para o público. O tempo me fez entender que compor é mais do que uma boa estrutura harmônica e melódica. Compor é pensar nos termos técnicos musicais, mas também, em como isso irá chegar até a plateia. Hoje, ainda trabalho com minhas harmonias um pouco “tortas”, mas, além disso, procuro imaginar como a música chegará ao palco: penso em iluminação, performances, imagens projetadas, samplers (sim, samplers!) e tudo o que pode garantir a transmissão da mensagem de forma limpa e equilibrada. O primeiro passo é definir onde cada elemento (som, imagem, movimento
Kraftwerk: música, iluminação, grafismos e vídeos 48 / JUNHO 2015
teclas & afins
PALCO
etc) pode ser usado. E, no que tange ao é o trabalho de composição técnica de cada instrumento, o que será disparado como música. Qual timbre estará em cada teclado complemento à execução da peça. ou sampler, o envio de clicks e trilhas para outros músicos (bateristas, por exemplo), Sempre um complemento, nunca o contrário sequências pré-gravadas etc. E, por fim, O tecladista não complementa a tecnologia: ensaio. Muito ensaio. Testar exaustivamente a a tecnologia complementa o tecladista! No estrutura construída para que tudo funcione palco, o computador passa a ser parte do perfeitamente. Ensaiar não somente a música, instrumental. E muitos casos, é nele que está mas o controle técnico. Aperfeiçoar o que todo o controle dos teclados. Com um software for possível e tornar a máquina parte de seu VST plugin host com recursos voltados para instrumento. apresentações ao vivo, é possível controlar Depois que tudo estiver pronto e testado, timbres internos nos teclados, suas trocas ou deve-se criar uma contingência a toda a substituição por instrumentos virtuais de estrutura para quando o famoso “e se” entrar alta qualidade, hospedados no PC, além dos em ação. E se alguma coisa der errado, não gatilhos para samplers, MIDI, volumes, ordem funcionar? E se um dos teclados parar sem de execução roteamentos e outros recursos. nenhuma explicação? E se as conexões O Brainspawn Forte (www.brainspawn. falharem? Contra isso, devemos deixar os com), por exemplo, é extremamente leve teclados programados para trabalharem de e intuitivo, projetado para o palco e capaz forma autônoma com os principais timbres de controlar vários equipamentos via ou similares aos VSTs que você utilizou. Assim, mensagens MIDI, além de oferecer recursos o show não para. Apesar de resultar em uma que facilitam a manutenção em uma situação versão um pouco mais simples do que a inicial, de palco, tornando alterações não previstas a música não para! Existem várias formas extremamente rápidas. Além dele, existem diferentes de aplicação de tecnologia. Esta, outros, como Cantabile, Chainer, Mainstage apesar de bastante comum, é apenas uma (apenas Mac), VST host etc. Com o apoio delas. Alguns tecladistas optam, por exemplo, de um software dessa categoria, as ideias e por estruturas baseadas apenas em recursos mensagens musicais desenvolvidas e prontas nativos dos próprios teclados. Mas para isso podem ser transmitidas de forma precisa e ao deve-se avaliar o custo de cada estrutura e controle do músico, que decide quando tudo definir a que mais se apresenta equilibrada deve acontecer em cima do palco. Portanto, nos quesitos custo-benefício ou aplicabilidade o segundo passo para garantir a transmissão ao cenário pessoal. Vamos discutir mais sobre da mensagem de forma limpa e equilibrada o assunto nas próximas edições. Até lá!
Wagner Cappia Iniciou seus estudos em piano clássico em 1982, com formação pelo Conservatório Dramático Musical de São Paulo. É sócio-diretor do Conservatório Ever Dream (Instituto Musical Ever Dream), tecladista, compositor e arranjador da banda Eve Desire e sócio-proprietário e responsável técnico do estúdio YourTrack. Músico envolvido na cena metal, procura misturas de estilos que vão desde sua origem natura l na música erudita até a música contemporânea, mesclando elementos clássicos e de ambiente em suas composições. Especialista em tecnologia musical, performance ao vivo para tecladistas, coaching para bandas, professor de piano, teclado e áudio. www.cappia.com.br - www.evedesire.com - www.institutomusicaleverdream.com teclas & afins
JUNHO 2015 / 49
pUXANDO FOLE
POR Jackson Jofre Rodrigues
Grandes festivais e competições mundiais Existem inúmeros festivais e competições de acordeon em todo mundo, mas poucos músicos tem conhecimento e participam desses eventos
Há muitas competições ocorrendo no mundo todo, algumas com maior expressividade. Um dos maiores festivais é o de Castelfidardo, na Itália (www.pifcastelfidardo.it), dedicado somente ao acordeon acústico, em todas as categorias, do mirim até Senior e Master. Este ano o festival ocorre de 17 a 20 de setembro e as inscrições vão até o dia 25 de agosto. Há também o Festival Primus, na Finlândia, evento gigante com mecanismo similar ao do programa American Idol. Durante as etapas, a
plateia de mais de 2.000 pessoas comparece com direito a gritos, bandeiras e faixas para assistir a apresentações que incluem desde videoclipes da vida de cada competidor e seu país, até banda e orquestra ao vivo acompanhando cada um. Outro festival importante é o Roland V-Accordion Internacional Festival, dedicado exclusivamente à marca e seu instrumento: o acordeon digital. É dividido em três etapas seleção, final nacional e final mundial – e tem
Campeões: Grayson Masefield e Pietro Adragna 50 / JUNHO 2015
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pUXANDO FOLE
concursos, tornando-se conhecidos tanto da plateia quanto dos jurados e dos outros competidores. Os grandes festivais mundiais passam pelo crivo de autoridades do acordeon, representados pela CIA (Confederação Internacional de Acordeon). Para representar o Brasil nessas competições, é importante contar com a autorização do presidente da Associação dos Acordeonistas do Brasil, cargo atualmente ocupado pelo senhor Lauro Valério. Matthias Matzke: fenô meno alemão
seu encerramento em Roma, na Itália. O maior dos festivais, contudo, é a Copa do Mundo de Acordeon (www.coupemondiale. org), que a cada ano é realizada em um país diferente, reunindo os melhores acordeonistas do mundo, em todas as categorias, em duas semanas de competições, shows e troca de informações. Este ano será realizada de 6 a 11 de outubro na cidade de Turku, na Finlândia. As inscrições vão até 31 de agosto. Para participar
Quando se pensa em competir em um festival mundial, primeiramente é necessário saber e estar consciente de que se irá enfrentar adversários muito bem preparados tecnicamente. Além desse fator, também se deve levar em consideração as tradições do acordeon internacional, tanto culturalmente, quanto os estilos e peças (obras, músicas) mais indicados. Como em qualquer outro tipo de competição, há os chamados ratos de festival, músicos que se dedicam quase que exclusivamente a se prepararem para esses
Campeões
A cada ano, muitos são os vencedores nos diversos festivais que acontecem pelo mundo, apresentando ao público artistas de talento e capacidade invejáveis. Um dos maiores é Frederic Deschamps (veja a edição 11 de Teclas & Afins ) que, além de ser um grande vencedor, é preparador de campeões e faz parte do grupo que comanda o acordeon pelo mundo organizando e realizando competições e eventos. Entre os jovens nomes, podem ser citados Grayson Masefield (Nova Zelândia), Pietro Adragna (Itália) e Matthias Matzke (Alemanha), todos alunos e discípulos de Deschamps. Tive o prazer de competir em dois destes festivais: o da Roland - de onde saí campeão nacional e quarto lugar na final mundial em Roma – e a Copa do Mundo, na Croácia – em que conquistei o terceiro lugar no ranking mundial, colocação inédita para o Brasil até hoje. Confesso que é uma experiência única, inimaginável e inigualável.
Jackson Jofre Rodrigues Acordeonista e produtor musical, atuando no cenário nacional com nomes como Gilbert Stein, Marlon e Maicon, João Neto e Frederico, Fernando e Sorocaba, Teodoro e Sampaio, Cristiano Araújo, Chitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e Luciano, Guilherme e Santiago, Banda Nanquin, Grupo Candieiro, Grupo Garotos de Ouro, Banda Moog e Banda Aurora Tocaia, entre outros. Tem mais de 40 discos gravados, 7 DVDs, indicação ao Prêmio Tim 2003, considerado oito vezes o melhor acordeonista do Rio Grande do Sul. Foi Campeão Brasileiro de Acordeon Digital Roland, 4º lugar na final mundial de Acordeon Roland em Roma, 3º lugar na Copa do Mundo de Acordeon na Croácia realizando três turnês pela Europa, Oceania e EUA. teclas & afins
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cultura hammond
por Jose Osorio de Souza
Hammond no Brasil: os pioneiros Em se tratando do órgão Hammond, sua presença existiu não somente no hit “A Whiter Shade Of Pale” da banda britânica Procol Harum, famoso e conhecido por todos:o músico nacional também usou esse instrumento com muita personalidade
A melhor fonte musical para se beber é a que vem das raízes, dos mestres que fizeram algo pela primeira vez e criaram a música. Contudo, muitos jovens não conhecem música. E não digo apenas a escola erudita ou o blues/jazz, mas o pop-rock. Além disso, muitos músicos brasileiros não conhecem música brasileira. O órgão Hammond existiu não somente no hit “A Whiter Shade Of Pale” da banda britânica Procol Harum, famoso e conhecido por todos. O m úsico nacional também usou esse instrumento. E com muita personalidade. Alguns dos grandes
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nomes do Hammond no Brasil estão listados a seguir. Djalma Ferreira
Nasceu no Rio de Janeiro em 1913 e aprendeu piano e violino na Itália. Já tocava de ouvido aos 14 anos e, em 1932, aos 18 anos, apaixonou-se pelo estilo da pianista Carolina Cardoso de Menezes, passa ndo a imitá-la. Em 1936, já era um profissional. Vem dessa época a amizade com grandes nomes da música brasileira como Noel Rosa, Henrique Batista e Marília Batista, por causa das participações que fazia em
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cultura hammond
programas no rádio. Sua vida empresar ial, na área de casas noturnas, também é bem-sucedida, tendo inaugurado a boate Embassy em Lima, ao lado de Josephine Baker, e adquirido sua própria casa de shows, a Gong, em La Paz. De volta ao Brasil, fundou a Drink, sendo o primeiro músico brasileiro a ter uma gravadora. Com carreira bem-sucedida com bandas, lançou crooners como Helena de Lima, Luís Bandeira, Miltinho e Jair Rodrigues, que embalados pela credencial de terem se apresentado ao seu lado ou mesmo feito parte dos Milionários do Ritmo tiveram carreiras solo de sucesso. Montou também a boate Drink, que lhe rendeu grande prosperidade financeira. Com dificuldades fiscais para manter uma de suas casas noturnas e disposto a novos desafios, foi para Las Vegas. Os dois primeiros anos foram difíceis, mas depo is conseguiu se firmar, assinou contratos, tocou com gente importante e tornouse parceiro de composição de Leonard Feather. Faleceu em 2004 em Las Vegas, aos 91 anos. teclas & afins
Walter Wanderley
Nascido em Recife em 1932, foi casado com a cantora Isaurinha Garcia. Vendeu mais de um milhão de cópias de seu álbum de lançamento Rain Forest. Influenciado por Tony Bennett e já com fama no Brasil no fim dos anos 50, foi com seu trio aos Estados Unidos em 1966, lançando seu primeiro single, “Samba de Verão”, de Marcos e Paulo Sérgio Valle. Com isso, alcançou o segundo lugar nas paradas, chegando à marca de um milhão de cópias vendidas naquele país. Pouco conhecido no Brasil, Wanderley teve reconhecimento internacional pelo trabalho realiza do com a cantora Astrud Gilberto, consolidando sua carreira no meio jazz ístico dos Estados Unidos. Morreu em 1986, em San Francisco. Ed Lincoln
Nasceu em Fortaleza em 1932 e foi para o Rio de Janeiro em 1951, onde iniciou a carreira artística tocando contrabaixo em clubes. Depois, passou para piano e então para o órgão Hammond. Trabalhou com Luís Eça, Dick Farney e Luiz Bonfá na década de 1950 e fez parte de conjuntos JUNHO 2015 / 53
cultura hammond
Ed Lincoln: descobridor de talentos
de casas noturnas, chegando a gravar um disco com o Trio Plaza. Seu estilo de tocar órgão, criado na década de 1960, tornouse moda em bailes da época. Gravou LPs pela Musidisc, gravadora da qual foi diretor musical e arr anjador, e depois fundou seu próprio selo, o “DeSavoya”. Nos anos 70 lançou o álbum Órgão e Piano Elétrico, pela CID, e em 1989 o disco Novo Toque, pela Elenco/Polygram. E lenco/Polygram. Cantores como Pedrinho Rodrigues, Silvio César, Orlandivo e Tony Tornado estiveram presentes em seu conjunto, além de muitos outros instrumentistas consagrados. Trabalhou na década de 1970 para as cantoras Beth Carvalho e Elza Soares. É famoso por ter usado pseudônimos em muitos discos, como Don Pablo de Havana, Les 4 Cadillacs, The Lovers, De Savoya Combo, Ed Kennedy, Claudio Marcelo, Danny Marcel, dentre outros. Morreu aos 80 anos de idade no Rio de Janeiro, em 2012.
da qual fizeram parte jovens que teriam relevância no cenário musical nacional dos anos 60 e 70, como Wilson Simonal, Roberto e Erasmo Carlos, Jorge Bem e Tim Maia. Em 1958, formou o conjunto Blue Jeans Rock, participando como pianista, mas só teria sucesso na década seguinte, então como organista, integrando o conjunto Sambrasa. Convidado por Erasmo Carlos em 1964 para tocar piano em uma de suas gravações, deparou-se no estúdio com um órgão Hammond pondo-se a exper imentar o instrumento. Erasmo gostou tanto que acabou utilizando Lafayette no órgão no lugar do piano. Convidado depois por Roberto Carlos, gravou com o rei de 1965 a 1970. Como o organista oficial do movimento, gravou mais de quarenta discos com artistas da Jovem Guarda. A sonoridade do movimento não seria a mesma sem Lafayette e seu Ham mond B3, sendo considerado o prim eiro a introduzir o órgão na música popular brasileira. Lafayette iniciou sua carreira solo em 1965, lançando álbuns que apresentavam versões instrumentais
Lafayette
Lafayette Coelho Varges Limp nasceu no Rio de Janeiro em 1943. Começou a ter aulas de piano no Conservatório Na cional de Música aos 5 anos, mas apesar da formação erudita, no final da década de 1950 se tornou músico de rock. Fez parte da famosa turma da Matoso, da Tijuca, 54 / JUNHO 2015
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cultura hammond
Lafayette: sucesso internacional
de hits contemporâneos. Todos fizeram muito sucesso, inclusive fora do Brasil, distribuídos em outros países. Além dos vários compactos lançados, gravou um total de mais de oitenta álbu ns. Premiado com vários troféus e discos de ouro, bateu recorde de vendagem e execução, além de ter excursionado em turnês pela America Latina. Passou a integrar o conjunto Os Tremendões em 2004 e, a partir de 2009, gravou mais três novos álbuns. Formou também a Lafayette Big Band, com foco na música latina. Lafayette produziu uma discografia reconhecida em todo o mundo, e é um orgulho para a cultura-Hammond nacional.
Jose Osório Osóri o de Souza Souz a Pianista de formação erudita, foi proprietá propr ietário rio de estúdio estú dio e escola escol a de música e Suporte Técnico da Roland Brasil. É tecladista da noite, compositor e escritor. Ama história hist ória e tecnologi tecn ologiaa dos sintetiza sinte tizadore doress e samplers, samp lers, mas é apaixonado por teclados vintages, blues, rock progressivo e música de cinema. Atualmente atua como músico gospel na cidade de Itu (SP). teclas & afins
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arranjo comentado
por rosana giosa
Canção americana em ritmo de bossa nova Transformar uma canção quaternária em bossa nova é um recurso interessante e muito utilizado na música popular
“Smile” foi composta por Charlie Chaplin em 1936 para ser tema de seu último filme mudo, intitulado T empos Modernos . A letra, muito poética, e o título foram colocados posteriormente, em 1954, po r dois parceiros: John Turner e Geoffrey Parsons. A canção foi gravada por muitos cantores de diferentes estilos, como Michel Jackson, Nat King Cole e, aqui no Brasil, Braguinha e Djavan. É uma canção quaternária que foi transformada em bossa nova canção a partir da segunda parte deste arranjo. Essa mudança de estilo é um recurso interessante que funciona muito bem para este gênero, pois cria um clima ao mesmo tempo sensual e brasileiro e dá nova roupagem ao arranjo. Outras canções estrangeiras também ficam muito bonitas quando usamos esse recurso. Como exemplos, podemos citar “Estate”, “Speak Low” e “The Look Of Love”, Love”, já gravadas em r itmo de bossa nova. “Smile”
A melodia é relativamente cur ta, de apenas 16 com passos, mas muito bonita e agradável. Neste arranjo, ela se repete três vezes com uma introdução e uma coda (ou final). Introdução: quatro compassos fazem o desenho de arpejos que acomp anha a primeira exposição do tema. invertidos, recurso muito bonito A1:: o tema é exposto com arpejos abertos e baixos invertidos, A1 que já foi usado em outras canções publicadas nesta revista. A2: o tema se apresenta em r itmo de bossa nova com os acordes distribuídos nas duas
mãos (veja compasso 21). A3: a bossa nova agora es tá apenas na mão
esquerda, esque rda, em sua forma for ma “estendida”, “estendida”, já que a mão direita faz a melodia em oitavas com acordes no meio e fica impossibilitada de dividir as notas dos acordes com a mão esquerda. Coda: uma sequência harmônica de 16
compassos foi criada para prepar ar o final, com um novo solo inspirado no clima dessa canção. 56 / JUNHO 2015
teclas & afins
arranjo comentado
“Smile”
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arranjo comentado
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arranjo comentado
Rosana Giosa Pianista de formação popular e erudita, vive uma intensa relação com a música dividindo seu trabalho entre apresentações, composições, aulas e publicações para piano popular. Pela sua Editora Som&Arte lançou três segmentos de livros: Iniciação para piano 1, 2 e 3 ; Método de Arranjo para Piano Popular 1, 2 e 3 ; e Repertório para Piano Popular 1, 2 e 3. Com seu TriOficial e outros músicos convidados lançou o CD Casa Amarela, com composições autorais. É professora de piano há vários anos e desse trabalho resultou a gravação de nove CDs com seus alunos: três CDs coletivos com a participação de músicos profissionais e seis CDs-solo. Contato:
[email protected] teclas & afins
JUNHO 2015 / 59
HARMONIA E IMPROVISACAO
por turi collura
Aprendendo com os gigantes: análise harmônica e estrutural Qual é o segredo de uma canção de sucesso? Em quais ingredientes se baseia? Nesse artigo analisamos uma música muito conhecida do ex-Beatles Paul McCartney, com o objetivo de aprender algo sobre como um gigante da canção popular compõe e arranja
No final da década de 1980, ouvi com interesse uma entrevista com o músico Paul McCartney na qual ele discorria sobre sua maneira de compor. Durante sua fala, disse, sorrindo, algo surpreendente: “se quiser compor uma canção de sucesso, inicie a música pela subdominante!”. Um
convite e tanto, vindo dele, proferido com simplicidade e autoridade! Lembrando aquela entrevista, resolvi analisar, para esta edição, uma música de 1984, muito bonita e que nos reserva surpresas interessantes: “No More Lonely Nights”. A canção foi inicialmente lançada
Paul McCartney: especialista em sucessos 60 / JUNHO 2015
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HARMONIA E IMPROVISACAO
em um filme produzido pelo próprio McCartney e que se revelou um fiasco total. Mas a música se colocou entre as melhores daquele ano e da década. Quem tem memória daquele período, certamente dançou e cantou muito acompanhando o seu refrão! Sim, eu integrei essa turma, confesso! Corria a época de “Careless Wisper” e “Wake Me Up Before You Go-Go” (Wham), de “Like A Virgin” (Madonna), mas também de “Money For Nothing” (Dire Straits). Eram os anos das baterias eletrônicas, dos baixos sintetizados e dos “claps” (as batidas de mãos) sampleados. A estrutura
Em uma visão macro, observamos que a música é articulada entre estrofes, pontes, refrãos e dois solos. Preparei uma imagem em que organizei essas seções por cores, para melhor observarmos como são dispostas. Logo podemos reparar certas irregularidades de compassos: estrofes e refrãos ora de 8 compassos, ora de 7; pontes de 3 compassos, que se tornam de 4 ou de 8 compassos. Que tal acompanhar a imagem enquanto ouvimos a música?
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JUNHO 2015 / 61
HARMONIA E IMPROVISACAO
Harmonia e “truques” compositivos
A música, que está na tonalidade de Fá Maior, começa com uma primeira estrofe. O primeiro acorde da música é o segundo grau, Gm7 (Paul McCartney iniciou mesmo com a subdominante, como disse na entrevista!). Mas o que soa muito interessante (“diferente”?) é o fato desse acorde apresentar o baixo em fá: Gm7/F. Os primeiros dois acordes formam uma cadência II-V, que não resolve no primeiro grau (cadência evitada), mas sim no sexto grau da tonalidade. No quarto compasso, temos uma cadência IV-V que, essa sim,
resolve (no compasso 5) no primeiro grau (F). Observe um detalhe: o sex to compasso da música é em 2/4. Encontramos esse expediente em muitas músicas de Paul, e, consequentemente, dos Beatles: uma quebra do fluxo por meio de compassos diferentes, de quiálteras e outros recursos interessantes. O último compasso dessa primeira estrofe ainda apresenta um acorde de dominante, mas com o baixo na subdominante. Podemos assistir a um vídeo com uma análise harmônica e formal da música, para, em seguida, nos aprofundarmos nesse estudo.
Segue uma segunda estrofe, em tudo igual à primeira, mas com um detalhe interessante, em relação à outra: falta o último compasso. Sua estrutura resulta ser, portanto, de 7 compassos.
62 / JUNHO 2015
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HARMONIA E IMPROVISACAO
Uma canção de sucesso alterna, quase sempre, partes diferentes: a estrofe propõe uma melodia, uma sequência harmônica; o refrão traz algo diferente, às vezes uma modulação ou apenas uma nova melodia, uma nova sequência harmônica. Frequentemente, estrofe e refrão estão ligados por pequenos trechos, em inglês chamados “bridges”, em português, “pontes”. Esse é o caso de “No More Lonely Nights”: após a segunda estrofe, Paul McCartney prepara o refrão por meio de uma ponte de três (!) compassos:
A importância do refrão
O refrão, normalmente, traz aquela melodia que gruda como chiclete em nossas cabeças, nos acompanhando um dia inteiro sem que consigamos nos livrar dela (pense, por exemplo, na música “All You Need Is Love”: o que veio em sua mente com certeza foi o refrão!). Frequentemente, o refrão é o lugar em que “tudo se encaixa”. Tudo que foi “dito” antes adquire sentido nessa seção da música. É onde – com as devidas exceções – o cantor pronuncia o título da música! Na canção que estamos analisando, o
refrão traz uma maior densidade rítmicoharmônica. É o ponto alto da música, em que Paul canta “No more lonely nights”. Os primeiros dois compassos apresentam uma cadência IV-V-I (com um pequeno intercalar “esperto” (F/A) que dura apenas uma colcheia, realizado pela banda e marcado pelo prato da bateria). A harmonia dos compassos 3 e 4 é igual, concluindo o período musical iniciado anteriormente. Em seguida, a mesma frase termina no sexto grau, seguindo em direção da dominante.
Após o refrão, McCartney reapresenta uma estrofe de 7 compassos (igual à estrofe 2) e, em seguida, uma ponte de 3 compassos (igual à anterior). Seguirá um novo refrão, agora com um compasso a menos (7 compassos): teclas & afins
JUNHO 2015 / 63
HARMONIA E IMPROVISACAO
Uma nova ponte (agora de 4 compassos) prepara a chegada de um solo de guitarra, que certamente contribuiu consideravelmente ao sucesso da música:
O bonito solo é de David Gilmour, o guitarrista do Pink Floyd, amigo de Paul (Beatles e Pink Floyd gravavam, nos anos 1960 pela EMI, uns ao lado dos outros, nos mesmos estúdios. A amizade entre os dois músicos foi além e os dois se apresentaram em algumas ocasiões em concertos. Gilmour aparece repetidamente na carreira de Paul como sideman). 64 / JUNHO 2015
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HARMONIA E IMPROVISACAO
A estrutura do solo é a da Estrofe 2: sete compassos apenas, em que Gilmour consegue colocar muita emoção. Seguem uma ponte (de 3 compassos) e um refrão (de 7 compassos), então surge uma nova ponte. Trata-se de uma nova seção de 8 compassos construídos sobre um pedal de dominante (alterna o acorde sus à tríade “normal”) em que Paul apresenta um novo material melódico:
Concluída essa seção, McCartney continua com outro trecho que pode ser considerado ainda uma ponte, composto pelos mesmos acordes, mas que comporta uma nova melodia. Paul canta “No more lonely nights” agora com outra melodia (em 1986, o refrão da música “Take My Breath Away”, trilha sonora do filme Top Gun usará essa melodia! Um acaso? Não? Quem sabe?).
Para terminar, David Gilmour retorna para mais um solo de guitarra gritante que fecha a música em fade-out. O novo solo é agora construído sobre o acorde de Lá bemol menor!
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JUNHO 2015 / 65
Concluindo
A análise de “No More Lonely Nights” nos leva a observar detalhes compositivos interessantes. Seu arranjo propõe, no decorrer da música, pequenas variações ao reapresentar suas seções, não caindo na banalidade da simples repetição. “Variação”, aliás, parece ser a palavra de ordem, que se substancia em pequenos detalhes que, certamente, passam despercebidos a ouvidos “leigos”, ao mesmo tempo em que cativam o ouvinte. A “receita” de Paul, para compor essa música de sucesso, contempla
ainda uma métrica irregular: nada de 8+8+8+8 compassos, nada de estruturas “Ctrl-C + Ctrl-V” bastante perigosas em nossos dias, em que dispomos de potentes softwares de produção musical! Então, vale a dica: para construirmos boas canções usemos todo tipo de variação e de alternância entre seus elementos. Lembrando que “a elegância está nos detalhes”, e que um bolo gostoso se faz com bons ingredientes, usados nas doses certas. Até a próxima!
Turi Collura Pianista, compositor, atua como educador musical e palestrante em instituições e festivais de música pelo Brasil. Autor dos métodos “Rítmica e Levadas Brasileiras Para o Piano” e “Piano Bossa Nova”, tem se dedicado ao estudo do piano brasileiro. É autor, também, do método “Improvisação: práticas criativas para a composição melódica”, publicado pela Irmãos Vitale. Em 2012, seu CD autoral “Interferências” foi publicado no Japão. Seu segundo CD faz uma releitura moderna de algumas composições do sambista Noel Rosa. Entre outras atividades, Turi é Coordenador Pedagógico do site www.terradamusica.com.br onde ministra os cursos online de “Piano Blues & Boogie”, e de “Improvisação e Composição Melódica” www.turicollura.com - www.terradamusica.com.br
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66 / JUNHO 2015
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ALEXANDRE PORTO
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