COLÔNIA LIBERDADE 1 - PR.
ISMAEL ALONSO Y ALONSO
Dr. Ismael Alonso Y Alonso nasceu aos 30 de dezembro de 1908, em Peirópolis, cidade próxima às queridas terras mineiras de Uberaba, e desencarnou em Franca-SP, aos 23 de março de 1964. Formou-se em Farmácia na cidade de Pindamonhangaba, em 1929, e, sempre em busca do saber, em 1934 formou se na Universidade Universidade de Medicina Fluminense, de NiteróiRJ. Mas a sua história de amor e dedicação ao povo francano só começaria no início de julho de 1939, quando sempre atuando como médico e humanista responsável, desempenhou também papel na vida pública como prefeito e vereador da cidade de Franca, fazendo-se destacar como defensoi da Saúde Pública. Mas os destinos de suas obras deveriam ser muito maiores e, não se rendendo ao brilho das riquezas materiais efêmeras, ainda encarnado começou a atender a todos que o procuravam sem condições financeiras, sem cobrar nada, e até mesmo distribuindo gratuitamente remédios, ficando conhecido carinhosamente em Franca como o "Médico dos Pobres". Atualmente, em trabalho junto aos encarnados, aproxima a grandeza da medicina espiritual à da medicina terrena convencional, convencional, através da mediunidade mediunidade de João Berbel, mostrando que este será um caminho a conduzir em união
os bons espíritos e os homens de bem na grande causa cristã. Durante a sua jornada terrena foi amparado por um protetor e orientador orientador espiritual, espiritual, o Dr. Bezerra Bezerra de Menezes, Menezes, que também a seu tempo andou pela Terra amparando e aliviando todos que sofressem. Sempre gratuitamente. gratuitamente. Grande homem e Espírito superior que foi Dr. Ismael Alonso Y Alonso integrou-se àqueles tantos que trabalham pelo grande Médico das Almas, Almas, Jesus, levando as as Luzes do Evangelho, para que o espírito se eleve em consciência diante dos desafios e bem-aventuranças desta grandiosa filosofia chamada Vida, dentro desta maravilhosa e gigantesca família universal chamada humanidade.
2 - JOÃO BERBEL - MÉDIUM João Berbel nasceu aos 30 de agosto de 1955, na cidade de Restinga, Interior paulista.
os bons espíritos e os homens de bem na grande causa cristã. Durante a sua jornada terrena foi amparado por um protetor e orientador orientador espiritual, espiritual, o Dr. Bezerra Bezerra de Menezes, Menezes, que também a seu tempo andou pela Terra amparando e aliviando todos que sofressem. Sempre gratuitamente. gratuitamente. Grande homem e Espírito superior que foi Dr. Ismael Alonso Y Alonso integrou-se àqueles tantos que trabalham pelo grande Médico das Almas, Almas, Jesus, levando as as Luzes do Evangelho, para que o espírito se eleve em consciência diante dos desafios e bem-aventuranças desta grandiosa filosofia chamada Vida, dentro desta maravilhosa e gigantesca família universal chamada humanidade.
2 - JOÃO BERBEL - MÉDIUM João Berbel nasceu aos 30 de agosto de 1955, na cidade de Restinga, Interior paulista.
De origem católica, inicialmente era avesso ao Espiritismo, mas descobriu-se médium, o que, aliado à epilepsia, fê-lo passar por provações, mas também ajudouo a encaminhar-se na prática caritativa que hoje direciona sua vida. Com o apoio carinhoso e decisivo de Arlete Berbel, com quem é casado desde 1979, vem, há mais de 16 anos, colocando sua mediunidade a serviço do Mundo Maior. Sob a orientação do mentor espiritual Dr. Ismael Alonso y Alonso, João Berbel busca alento e conforto para milhares de pessoas. Em Franca, Interior de São Paulo, com auxílio de voluntários e colaboradores, mantém em atividade o I.M.A. (Instituto de Medicina do Além), que, nestes últimos dezesseis anos, já atendeu mais de 2 milhões de pessoas, vindas de de todos os estados estados brasileiros, necessitadas de cura física e esclarecimento esclarecimento moral e espiritual. Além da realização de cirurgias espirituais sem cortes, o IMA cultiva, em sítio próprio, plantas medicinais e manipula fórmulas fitoterápicas em laboratório próprio. O trabalho e os remédios são oferecidos ao público gratuitamente pela Entidade, que também mantém a Escola Madre Teresa de Calcutá — que que abriga o PróJovem de Franca e distribui cestas básicas, sopas e refeições (5000 semanais). Para tanto, contribui o arrecadado em direitos autorais dos
mais de 216 livros, psicofonados pelo mediuin João Berbel, de diversos e elevados autores espirituais. Esses direitos são revertidos em importante auxílio no custeio das despesas e investimentos necessários ao atendimento cada vez maior de tantos irmãos necessitados de alívio, amparo, ensinamentos e esclarecimentos esclarecimentos pelas vias da esperança e do amor universal cristão.
3 - PREFÁCIO Nesta história contaremos contaremos a vida vida de uma moça moça que teve a grandeza de perceber que tudo está baseado na lei do amor e, com a sua bondade, esteve sempre ajudando aos necessitados durante a escravatura brasileira com todas as dificuldades da época. Laura teve um caminho diferenciado, passou por situações complicadíssimas, mas teve sabedoria e compreendeu que poderia usar de de seus conhecimentos conhecimentos para curar curar os doentes, doentes,
venceu o preconceito e conquistou simpatia, pois ale mesmo homens brancos pediam auxílio a jovem. A Colônia Liberdade mostra nos que, mesmo em meio a tantas tribulações, é possível reconhecer o amor e a caridade, e através deste entendimento, ela abre as portas da sua casa para atender aos doentes e necessitados, contando sempre com a ajuda de seu marido Inácio Barbosa, que juntos dedicaram a vida aos irmãos enfermos. Os Editores ..1 FAZENDA LIBERDADE ..2 - O FUTURO DE UMA CRIANÇA ..3 - O PEDIDO ..4 - O COMBINADO ..5 - A COBRANÇA ..6 - O NEGRO SALVA O BRANCO ..7 - A APARIÇÃO ..8 - O
SOFRIMENTO ..9 - A FUGA ..10 - AS COBRANÇAS ..11 - O AMOR ENTRE O JOVEM CASAL ..12 - A COLÔNIA DA FELICIDADE ..13 - A VINGANÇA ..14 - A JUSTIÇA ..15 - O PERDÃO ..16 - MISSÃO CUMPRIDA
1FAZENDA LIBERDADE 1 - FAZENDA LIBERDADE Na fazenda Liberdade, por volta de 1710, o coronel Juvêncio Bragantino Pádua de Jesus, um homem muito bondoso, era contra a escravatura e tratava seus negros com muito respeito, todos viviam bem e até gozavam de
algumas regalias. Trabalhavam no ramo da cana de açúcar e seguiam as orientações de Joaquim, um negro de mais idade, mas que honrava o posto de "braço direito do coronel". A fazenda Liberdade tinha esse nome pois os negros nunca foram tratados como escravos, todos faziam parte de uma grande família e trabalhavam com muito amor e dedicação naquele enorme canavial. O coronel sempre comandou muito bem a lida na fazenda, tinha apenas a ajuda de Joaquim pois seus filhos foram todos estudar na Europa e por lá ficaram, mas quando Manoel o filho mais velho retornou cheio de ideais e começou a implantar seus conhecimentos na fazenda. O nome Liberdade já não se enquadrava tão bem naquele ambiente, pois o jovem não tinha o mesmo respeito pelos escravos que seu pai e, como o coronel Juvêncio já estava com certa idade, não tinha autonomia e estava perdendo as rédeas da situação. Surgiram muitas diferenças entre pai e filho, Juvêncio não aceitava o preconceito e o desrespeito que Manoel tinha pelos escravos, pois ele sempre conviveu bem com todos, andava livremente pela senzala, comia junto com os negros e sempre teve o apoio de sua esposa Isabel, que também tinha muito carinho e ajudava muito aqueles irmãos de cor. Dentre as famílias dos escravos, destacava-se Chica, filha de Joaquim, uma negra que fazia os trabalhos da casa grande e ajudava muito sua patroa, tinham muito amor
uma pela outra como se fossem irmãs. Quando Chica deu a luz a sua primeira filha, Isabel escolheu o nome de Laura, uma negrinha tão bela e delicada que encantou a todos. Conforme a menina crescia mais carinho tinham por ela, mas sob a nova direção de Manoel, Juvêncio temia pelo futuro de Laura. DIANA DE AGUIAR
2-O FUTURO DE UMA CRIANÇA 2 - O FUTURO DE UMA CRIANÇA O coronel estava envelhecendo e já não andava pela fazenda como antes, ficava apenas sentado na varanda da casa grande olhando de longe suas plantações, criações e todas as inovações de Manoel. Mas sempre estava na companhia de seu grande amigo Joaquim, pois o tempo também havia passado para ele e juntos recordavam com carinho o passado. — Isabel, Isabel, venha aqui mulher. — Sim marido, diga. — Traga um trago daquela cachaça boa que está guardada.
— Marido você não pode beber. — Um homem tem direito de morrer do jeito que quiser,
de aproveitar o pouco tempo que lhe resta, olhe para esses campos e pense no quanto trabalhei nesta terra. Quando cheguei aqui ainda era um menino e ao lado de meu pai trabalhei duro para construir essa fazenda, essa é a nossa casa, tudo prosperou segundo a vontade do meu pai, e hoje estou velho e vejo tudo que pude fazer, por isso penso que posso terminar minha vida como bem quiser. — Respirou fundo e continuou — Meu pai me ensinou a ter respeito pelos escravos e assim como minha amizade por Joaquim, meu pai tinha um amigo negro, o Zico, e com ele trocava conversas e bebiam cachaça na mesma caneca, um preto e um branco bebiam do mesmo copo e assim ele me mostrou como ser um homem de bem e me criou para assumir tudo nessa fazenda, pois meus irmãos foram para a Europa, mas eu me aventurei a seguir os passos de meu pai e até hoje sei que ele está ao meu lado. Quando andava pelas plantações a cavalo, sentia a presença dele e o meu corpo arrepiava, mas eu sabia que ele estava ali para me ajudar. Por isso, mulher, eu te digo que já fiz o que tinha que fazer nesta vida e mereço tomar um trago quando quiser, era assim como meu pai e Zico, traga apenas uma caneca para mim e Joaquim. Isabel atendeu ao pedido de Juvêncio e foi buscar a cachaça, logo retornou com uma caneca para os amigos dividirem. Juvêncio deu um trago e ofereceu ao seu amigo.
— Agora é sua vez Joaquim, beba! Joaquim bebeu —
Essa é da boa mesmo Juvêncio.
Os dois ficaram por ali, sentados em cadeiras confortáveis de madeira e com os pés para cima numa soleira. — Descansa Joaquim, chegou o tempo de nós
descansarmos, já trabalhamos muito nessa vida, e penso que nosso fim está chegando, já fizemos negócio com gado, compramos e tocamos por essa estrada a fora, trabalhamos muito nessa terra, sempre seguindo os ensinamentos de meu pai, agora estamos velhos, e eu devo morrer primeiro que você, afinal você é um negro forte e eu um branqueio.
— Não patrão, o senhor é mais que todos esses peões que
temos aqui.
— Ora Joaquim, não exagere, mas tenho outro assunto que
preciso conversar, é sobre sua neta Laura, mas quero que ela esteja presente, vou pedir para Chica ir chamá-la. Depois de alguns minutos a menina chega desconfiada. — Laura querida, sente-se aqui.
Tanto Joaquim quanto Laura não estavam entendendo onde coronel Juvêncio queria chegar, reunindo os dois ali, mas ficaram em silêncio e o coronel continuou. — Laura, você recebeu nome de branco, nome de pessoa
importante e esse nome foi escolhido por Isabel, quero que saiba que te consideramos nossa neta, mas os tempos estão
mudando, as coisas nesta fazenda não são como antes e eu temo pelo seu futuro. Por isso penso em algo melhor para você que ainda é uma menina, nós que já estamos velhos podemos continuar nesta situação, mas você não. Joaquim e Laura estavam ainda mais confusos, pois não tinham idéia do que o coronel estava propondo, mas ele continuou explicando. — Portanto, Laura, penso em conversar com o padre
Miguel afim de te levar para a igreja, creio que lá você poderá ter uma boa educação e irá crescer longe do preconceito de meu filho Manoel, eu aprendi tudo com meu pai e segui seus princípios nesta fazenda, mas não consegui ensinar meu filho. — Coronel, em tudo que vejo nessas terras me lembro de
seu pai, a lida com o gado, os canaviais, a construção do engenho, todo esse açúcar estocado, por mais que a vida mude por aqui a lembrança de seu pai não poderá ser apagada.
— Ah! Joaquim, você tem toda a razão, fizemos o que
pudemos, mas agora os tempos são outros, tudo está muito moderno. Manoel veio cheio de ideais e não tenho forças para ir contra ele, já estou muito velho, mas sinto necessidade de cuidar do futuro de Laura. Queria poder interceder por todos os negros, mas não vai ser possível, por isso te peço que amanhã você saia bem cedo e busque o padre Miguel para que eu possa acertar isso. Joaquim concordou com tudo, mas a menina permaneceu em silêncio pois não sabia bem o que estava acontecendo,
mas logo sua mãe lhe chamou e ela voltou aos seus afazeres, mas os dois amigos permaneceram naquela varanda, tomando a cachaça e relembrando os velhos tempos até tarde da noite, tendo apenas a companhia dos vagalumes que iluminavam o gramado frente a casa grande. Mas Joaquim estava encabulado com a idéia do coronel. — Mas você vai entregar Laura para ele? — Olha Joaquim, isso é o melhor a ser feito, se eu pudesse
eu entregava todas as crianças desta fazenda.
Joaquim confiou na proposta de Juvêncio, mas como já era muito tarde despediu-se e foi para sua casa. Juvêncio passou pela cozinha e comeu uma sopa que Isabel havia deixado sobre o fogão, mas logo recolheu-se ao seu quarto onde sua esposa o esperava. — Isabel eu sei que a noite é fria, mas deixe a janela
aberta, eu quero dormir olhando as estrelas, mas assim que eu pegar no sono você pode fechar novamente. Ela atendeu ao seu pedido, deitaram os dois e ficaram por muito tempo admirando o céu, a luz da lua que iluminava os campos, Juvêncio fez suas orações e finalizou: - Senhor Deus, no momento que julgar certo acolha a minha alma e que ela esteja em suas mãos.
Imediatamente Isabel interrompeu: - Está ficando doido homem, agora você inventou essa história que vai morrer e só fala nisso, você não vai morrer tão cedo, deixa de besteira.
— Ah! mulher, logo vou partir, eu sei que meu tempo está
no fim, não tenho mais nada para fazer nessa vida, segui os ensinamentos de meu pai e durante muitos anos fomos muitos felizes nesta fazenda. Éramos uma grande família, fazíamos festas na senzala, comíamos juntos, você ajudou em muitos partos das negras da fazenda, ajudamos a criar essas crianças que hoje já são adultos trabalhadores e tem também suas famílias. Mas isso acabou, Manoel não tem esse sentimento, por isso penso que não tenho mais nada para fazer por aqui. Isabel ficou em silêncio e Juvêncio voltou a fazer suas orações e admirar as estrelas. Logo ela percebeu que seu marido havia dormido, levantou-se e fechou a janela e depois de uma boa noite de sono o galo cantou no terreiro anunciando o nascer do sol. DIANA DE AGUIAR 3-O PEDIDO 3 - O PEDIDO
O coronel levantou e foi tomar seu café na cozinha. Como de costume, sentou-se e chamou Chica que estava lavando as louças. — Chica, senta aqui, vamos conversar. Imediatamente a
negra obedeceu e sentou-se.
— Você já deve estar sabendo o que conversei ontem com
seu pai, eu estou ficando velho e penso que devo cuidar do
futuro de Laura, pois você sabe que as coisas aqui na fazenda estão só piorando para os negros. — Sim coronel, é verdade, Manoel está castigando os
escravos sem motivo, pois o senhor sabe que sempre fomos dedicados ao trabalho nesta fazenda. Ele também disse que vai arrumar um capataz, pois, assim que o senhor morrer, acabarão todas as regalias, estamos todos pensando em ir embora. — Vocês não vão embora porque ele não vai deixar, e eu
temo por Laura, ela ainda é uma criança e sinto que preciso protegê-la dessas crueldades. Por isso pedi que Joaquim buscasse o padre Miguel, lá ela terá boa educação, aprenderá a ler e escrever, bordar, costurar, e pode ajudá-lo nos afazeres da igreja. Ela terá chance de uma boa vida, só lamento não poder fazer isso para todos os escravos. Chica balançou a cabeça em sinal positivo e em seguida o coronel se levantou com a caneca de café na mão e foi sentar-se na varanda. Ficou lá durante toda a manhã com seus pensamentos, até que avistou dois cavaleiros cruzando a porteira. Era Joaquim a cavalo e o padre montado em um burro, que logo reconheceu como sendo o belo animal que havia doado para a última quermesse. Logo estavam na frente da varanda e já desmontaram e amarraram seus animais. — Bom dia amigos, entrem e venham tomar um café.
Os dois entraram e se acomodaram, logo foi servido café e alguns biscoitos.
— Ah! padre, que bom tê-lo em minha fazenda, nossa
amizade já tem muitos anos e eu fiz o que pude para ajudar na construção da igreja, mas Deus nos abençoou.
— É verdade coronel, graças a Deus e também a sua ajuda
tudo deu certo.
— Pois é padre, mas na verdade te chamei aqui porque
preciso te pedir um favor.
— Claro coronel, se estiver ao meu alcance quero servi-lo
no que precisar.
— Bom padre, temos aqui na fazenda uma criança negra,
neta de Joaquim, mas é como se fosse nossa neta também, temos muito amor por ela e queremos que ela tenha um bom futuro e chances na vida, ela tem a alforria e é livre, e queremos entregá-la em suas mãos, pedimos que cuide dela e ensine tudo que sabe à ela. — Ora coronel será um imenso prazer cuidar dessa
menina, ela estará protegida na igreja. É, eu já tive notícias que as coisas nesta fazenda mudaram muito, penso que o senhor tem razão em tirá-la daqui.
— Pois é, o senhor sabe como era nossa convivência com
os escravos, vivíamos livres, éramos uma família, mas meu filho Manoel não tem esse pensamento, e eu já não tenho o controle da situação.
— Gozado, pois o nome da fazenda era liberdade e fazia
jus a esse nome.
— Esse nome foi dado pelo meu pai, quando pisou nessas
terras e viu como eram promissoras e começou seu legado, sempre com respeito pelos negros, deixando todos livres e me ensinou a ser assim. Mas não consegui passar esses ensinamentos ao meu filho, isso me entristece muito, pois ele é muito preconceituoso e está maltratando muito essas pessoas, isto é totalmente contra tudo que pregamos por uma vida inteira. Eu não posso fazer nada, não tenho autoridade, nem forças, queria poder ajudar a todos os negros, mas só posso interceder por Laura. — Ainda existe muito preconceito por aí, na cidade
mesmo as pessoas fazem muita diferença, o negro tem que trabalhar dia após dia, do nascer ao por do sol, sem nenhum descanso, sem sábado, nem domingo, não tem liberdade nenhuma.
— Por isso que eu te peço, padre, cuide dessa menina,
tenha sempre em mãos a sua alforria e faça de tudo para que ela seja bem tratada.
— Claro coronel, pode ficar sossegado que farei o melhor
por essa criança, mas mudando de assunto, queria dizer que estamos preparando uma festa na igreja, o senhor pode nos ajudar com alguma coisa? Estamos arrecadando fundos, pois precisamos fazer uma reforma na nossa paróquia . — Pois pode contar com a minha colaboração padre.
Amanhã mesmo eu mando entregar mantimentos, açúcar, arroz, feijão e algo mais que eu julgue necessário, alguns bezerros para o senhor leiloar. Porém dessa vez não
poderei estar presente nesta festa, mas enviarei tudo que posso. — Eu agradeço muito coronel e quando a menina vai para
a igreja?
— Padre, eu já mandei a Chica arrumar as coisas de
Laura.
O coronel chamou Isabel e pediu que fosse buscar Laura, a menina chegou acanhada e sentou-se na cadeira em frente ao seu patrão. — Laura, você vai morar em outra casa. — Mas coronel, o senhor vai me separar da minha mãe, o
senhor vai me vender?
— Não minha filha, você é uma negra livre, mas vai sim
ficar longe da sua mãe, longe desta fazenda e de todos nós, você vai para um lugar melhor, pois tempos difíceis virão por aí, então o padre vai te levar para a igreja e cuidará de você, ele vai te ensinar a ler e escrever, você vai crescer longe das maldades que meu filho está implantando nesta fazenda e, quando você já for uma moça, terá condições e conhecimento para ajudar seus irmãos e os outros negros desta e de outras fazendas. Eu também vou te dar uma propriedade, um lugarzinho para você morar quando crescer e casar, mas por enquanto vou deixar isto na responsabilidade do padre. É um sitiozinho de apenas três alqueires, lá tem uma casa muito boa e é sua, agora pode voltar aos seus afazeres.
A menina concordou com tudo que seu patrão lhe disse e o coronel voltou-se para o padre. — Padre, agora quero pedir que o senhor vá até a senzala
e abençoe tudo por lá.
Enquanto isso o coronel ficou conversando com Joaquim. — Joaquim pega aquela minha mula ruana e traga aqui por
favor.
Assim que seu amigo veio com a mula selada, o coronel chamou Laura. — Esse animal é seu, você vai cuidar bem dessa mula, ela
ainda é bem jovem, mas é muito bonita.
A menina ficou muito feliz com o presente, mas logo entrou para terminar de arrumar os seus pertences. No fim da tarde, Laura montou em sua mulinha, amarrou suas malas e seguiu viagem ao lado do padre, mas ninguém conseguia conter as lágrimas de Chica, Isabel ficou ao seu lado tentando consolar a sua velha e querida amiga. — Chica, o que o Juvêncio está fazendo vai ser muito bom
para Laura, ela terá uma oportunidade única que nenhuma dessas crianças nessa fazenda poderá ter, e nós vamos visitá-la sempre, eu te prometo.
Neste momento o coronel entra na cozinha senta-se junto a
elas e serve-se de uma xícara de café. — Por que você está chorando? Estou tentando fazer o
melhor para Laura, ela vai aprender muito na igreja, vai trabalhar na casa do padre e, quando for moça, terá condições de te ajudar na sua velhice, ajudará também outros negros que não tiveram a mesma oportunidade que ela.
— Mas e se o padre não fizer nada disso. — Eu irei cobrar tudo isso dele. — Mas e se o senhor estiver morto? — Minha filha, se ele não cumprir o nosso combinado, eu
vou perseguí-lo depois da morte, pode ficar sossegada, mesmo por que, de tempos em tempos, o Joaquim vai lá dar uma olhada em como estão indo as coisas. Chica foi ficando mais tranquila, e reconheceu que realmente isso era o melhor para sua filha.
— Eu tenho muita esperança nessa menina, ela vai ter
muita cultura e vai voltar para cuidar desses negros, eu não consegui ensinar isso a Manoel, mas Laura tem bom coração, é diferente dele. Tendo Laura como esperança para aliviar o sofrimento que virá, posso morrer tranquilo por que tenho certeza que essa menina vai seguir a doutrina da fazenda Liberdade, assim como meu pai me ensinou. Isabel já estava ficando incomodada com essa espera de
Juvêncio pela morte. — Ei Chica, esse homem só fala nisso agora, está com
mania de dizer que vai morrer, parece que deseja isso. O coronel respirou fundo e soltou o ar lentamente.
— Sabe mulher, eu queria que os nossos filhos estivessem
aqui. Eles foram todos para a Europa, enviamos dinheiro para eles , mas nunca temos nenhuma notícia, eles nem vem nos visitar, nem ao menos sabemos se casaram ou se têm filhos, nem se lembram de nós e apenas Manoel ficou por aqui, mas ele é diferente de nós, não seguirá os ensinamentos de meu pai, por isso tenho tanta fé em Laura. DIANA DE AGUIAR 4-O COMBINADO 4 - O COMBINADO
Depois de alguns dias o coronel Juvêncio chama o Joaquim. — Joaquim, preciso que você vá à cidade e veja como estão as coisas com Laura, dê uma sondada em como o padre está tratando a nossa menina e diga a ele que venha aqui na fazenda buscar as minhas colaborações para a quermesse. Joaquim obedeceu às ordens do coronel e, no outro dia pela manhã, montou em seu cavalo e seguiu para a cidade. Quando chegou ficou alguns minutos parado em frente à igreja, desceu do cavalo, tirou o chapéu e pensou: — Eu
não sei se estou certo ou errado, se Deus é branco ou se é preto, mas sei que foi com muito esforço que ajudei na construção dessa igreja, só não entendo o por quê de nem eu e nem qualquer outro negro poder entrar aí dentro. A igreja é só para os brancos? Desviou aquele pensamento e seguiu para o fundo da igreja, na casa do padre. Lá chegando, encontrou dona Celestina, uma senhora muito bondosa, uma beata que seguia todo o cronograma da igreja e ainda ajudava o padre em tudo que precisasse, inclusive na arrumação de sua casa. — Bom dia dona Celestina. — Ora, ora, Joaquim, o que te traz aqui homem de Deus? — Eu vim para conversar com o padre, dei uma olhada na
igreja por fora, mas não o vi, não entrei para procurar por que negro não pode entrar na igreja, sabe como é.
— Sei bem, Joaquim, mas entre, aqui você pode entrar,
sente-se que eu vou te arrumar um pão que acabei de assar e um leite quente.
Joaquim acomodou-se por ali e enquanto aguardava por dona Celestina viu Laura passar com uma vassoura, estava faxinando a casa. Cumprimentou a neta mas logo ela voltou aos seus afazeres e dona Celestina voltou com o pão e o leite. — Dona Celestina, o coronel mandou que eu viesse aqui
para ver como a menina está sendo tratada.
— Laura é uma menina muito prendada, o padre mandou
lhe passar todo o trabalho e ela o faz muito bem.
— Mas ela não veio aqui para trabalhar, e sim para ajudar
em algumas coisas. Ela está aqui para aprender os ensinamentos da igreja, para rezar, para estudar, aprender ler e escrever, costurar, bordar, essas coisas.
— Para mim será um prazer ensiná-la tudo que sei, mas
acho gozado, pois o padre me orientou a passar todo o trabalho pesado para ela e também a colocou para dormir naquele quartinho ruim lá de fora.
— Pois é, o padre parece não estar honrando o combinado
com o coronel.
— Eu também acho que Laura é muito novinha para esse
tipo de serviço, mas fique tranquilo pois eu me comprometo a ensiná-la tudo que sei.
— Eu agradeço, mas mesmo assim, o coronel não vai
gostar nada dessa história.
— Eu penso que você deve conversar com o padre. — Mas foi para isso que vim, além desse assunto, também
tenho outros a tratar com ele.
— Eu vou chamá-lo, mas fique tranquilo Joaquim, agora
que sei bem desse combinado, vou cuidar muito bem dessa menina e ensiná-la de tudo.
Dona Celestina deixa Joaquim por alguns minutos até que vai à igreja para chamar o padre, mas logo retornam. — Olá padre Miguel. — Olá Joaquim, o que o traz aqui? — O coronel pediu que eu viesse trazer um recado, ele
disse para o senhor ir até a fazenda buscar suas prendas.
— Hoje eu não posso ir, mas amanhã vou até lá. — Está certo, amanhã o senhor vai então, mas e a menina,
como é que está?
— Está uma beleza, estou ensinando tudo e ela vai
aprender direitinho.
— É bom o senhor fazer tudo direitinho mesmo porque o
coronel vai vir sempre ver como ela está.
— Ora, será que ele está vindo? - o padre ficou
desesperado.
— Estou apenas dizendo o que ele me disse, fique esperto,
mas agora vou voltar à fazenda, já fiz o que tinha para fazer por aqui.
Joaquim pegou a estrada com pensamento fixo naquela situação: - Será que Dona Celestina está mentindo? Mas ela parece ser boa pessoa e não vou é com a cara desse padre, se ele fosse bom, deixava os negros entrarem na igreja. — tirou o chapéu e coçou a cabeça. — Que notícia
devo dar ao patrão? Se eu disser que o padre não está cumprindo o combinado o coronel vai ficar muito zangado e ao mesmo tempo muito triste, mas ele sabe o que faz, e também tenho fé que dona Celestina será boa para a nossa menina. E seguiu por aquela estrada matutando aquilo tudo. Mas assim que cruza a entrada da fazenda avista o coronel sentado na varanda já a sua espera. — E aí Joaquim como é que está Laura? — Ora patrão, ela está bem. — Joaquim, você não é bobo, você sabe bem por que eu te
mandei lá, não sabe?
— Sei sim, o senhor me mandou até lá para eu bisbilhotar. — E tudo está como eu mandei? — Oh! patrão, vou ser bem sincero, esse padre não está
cumprindo o combinado, não está ensinando nada a ela, está pondo a menina na faxina pesada e a colocou para dormir num quartinho bem ruim do lado de fora da casa. Mas eu expliquei tudo à dona Celestina e ela tem muito carinho por Laura e se comprometeu a cuidar dela, mas mesmo assim penso que você deveria ter cuidado com esse padre.
— Pois bem, e você falou para o padre vir aqui? — Falei sim, ele disse que vem amanhã de manhã.
— Está certo, pode deixar que eu vou ter um dedo de
prosa com esse padre, mas agora me faça um favor, mande preparar as prendas para a igreja, não vai ser muita coisa, só algumas sacas de arroz, feijão, milho e pede para alguém matar um porco para oferecermos um banquete ao padre, eu sei que não gosta de carne de porco, mas aqui ele vai ter que comer. Manda preparar tudo, fritar e colocar na lata, e fique tranquilo que tudo vai dar certo, Laura vai ser bem cuidada, deixa comigo. Joaquim foi imediatamente realizar as ordens do coronel, e assim que estava tudo pronto retornou. — Pronto coronel, já está tudo como o senhor pediu. — Muito obrigado Joaquim, agora faz outro favor de ir lá
na cozinha e pedir uma cachaça para Isabel.
Joaquim foi até lá meio acanhado, pois sabia que Isabel não gostava dessas coisas. — Dona Isabel, o coronel pediu que eu pegasse daquela
cachaça.
— Olha Joaquim, você heim? Fica incentivando seu
patrão a beber essa porcaria, está cansado de saber que ele está com o pé na cova. — Desculpe senhora, mas eu apenas estou transmitindo os
pedidos dele.
— Eu sei, eu sei bem como é o meu marido, me desculpe,
tome, pode levar, não adianta contrariar. E com a garrafa embaixo do braço, Joaquim retorna à varanda e serve o coronel, ele toma um gole e devolve a caneca a Joaquim. — É meu amigo Joaquim, eu estou preocupado com o que
você me disse sobre Laura, as coisas não estão acontecendo conforme eu queria, o que me consola é pensar que dona Celestina está lá. — Pois é, coronel, aquele padre não me engana.
— Mas se aquele padre não cumprir o que prometeu ele
vai se arrepender tanto, pois hão vai encontrar lugar nesse mundo que vá livrá-lo de mim. DIANA DE AGUIAR 5-A COBRANÇA 5 - A COBRANÇA
O coronel acordou cedo e, como de costume, sentou-se na varanda e tomou o seu café, ficou admirando a paisagem enquanto aguardava a chegada do padre, mas logo o avistou lá em cima, na estrada, montado em sua mula, veio calmamente até a entrada da casa e amarrou a mula na porteira. — Que a paz esteja contigo. — Com o senhor também padre, entre, venha tomar um
café. O padre sentou-se naquela varanda e começou a conversar com o coronel sobre os acontecimentos da igreja, mas logo foi interrompido. — Padre eu sei que o senhor não tem nada contra os
negros, que é uma pessoa muito boa, mas eu tenho uma dúvida, por que o senhor não permite que os negros entrem na igreja?
— Como o senhor sabe existem outros coronéis além do
senhor, outras fazendas e outro pessoal que frequentam a igreja, se eu permitir que os negros entrem, irei criar uma confusão e isso vai me gerar muitos problemas, mas eu tenho certeza que chegará o dia em que todos poderão frequentar a casa de Deus.
— Sei bem padre, isso também inclui o caso de Laura, por
isso o senhor a colocou num quarto ruim do lado de fora da casa paroquial e também a colocou como faxineira de serviços pesados? O senhor me prometeu uma coisa, mas não cumpriu, pois eu vou dizer uma coisa e o senhor vai guardar dentro da memória, pois essa deve ser a última vez que nos encontramos, esta fazenda sempre foi livre de preconceitos. Junto com meu pai colocamos cada moirão de cerca, fizemos benfeitorias, sofremos, mas conseguimos construir tudo nesta fazenda, sempre dei graças a Deus por cada negro que trabalhou conosco. A cada um que chegava eu recebia com os braços abertos, eram famílias que sofreram por maus tratos de outros fazendeiros, mas aqui sempre foram tratados como da família, e eu penso que é assim que deve ser.
— Essa história coronel, o senhor já me contou. — Eu sei padre, e já contei muitas vezes, mas parece que
mesmo ouvindo tantas vezes a mesma história o senhor ainda não se conscientizou. Mas o que eu quero mesmo dizer para o senhor é que meu pai já morreu há muitos anos, mas ele nunca saiu desta fazenda, nunca me abandonou, às vezes saio cavalgando por esses pastos e quando sinto um arrepio sei que ele está ao meu lado e sempre converso com ele. Por isso, padre, lembre-se bem de nosso combinado, pois a morte não vai me impedir de cobrá-lo, eu cumpri a minha parte, nunca deixei nada faltar àquela igreja, e ainda hoje o senhor levará outra carga e também quatro vacas com bezerro no pé, então cuide bem de Laura e ensine tudo direitinho àquela menina, se não, padre, nem depois da morte te deixarei em paz. O padre ficou paralisado e apertou forte os braços da cadeira, mas logo foram chamados para o almoço. Quando o padre viu a mesa posta ficou ofendido. — Ora Coronel, o senhor sabe que sou de descendência
judia, eu não me alimento de carne de porco.
— Mas hoje o senhor vai comer, porque esta é a última
vez que vamos comer juntos, então em minha memória e em memória dos negros, o senhor come esta carne bem preparada, os meus funcionários são bons cozinheiros e comem o alimento bom, mas em muitas senzalas por aí comem praticamente restos de carne no meio do fubá moído de uma forma que o senhor não tem condições de
entender. — Nunca imaginei que enfrentaria uma situação dessas,
que Deus me perdoe!
— Se Deus não te perdoar por comer a carne de porco,
como te perdoará por não permitir que os negros entrem na igreja?
— Eu sou contra o trabalho escravo, o senhor sabe e tenho
falado até mesmo em meus sermões.
— Está certo padre, então vamos comer, o senhor bebe o
vinho e nós tomamos da pinga, ou o senhor quer beber comigo?
E o padre bebeu da cachaça e comeu a carne de porco a contragosto, pois percebeu que sua situação estava difícil nas mãos do coronel. Assim que terminaram de almoçar, o padre deu algumas desculpas, disse que tinha alguns compromissos e logo deu jeito de pegar sua carga e ir embora. O coronel foi fazer a sesta na varanda e chamou Joaquim. — Joaquim, mesmo com tudo que disse àquele padre, não
sei se as coisas vão melhorar por lá, por isso peço que você vá àquela igreja toda semana ver como está
Laura, mas ele está avisado, se não cumprir o combinado, vou persegui-lo até depois da morte. — Pare com essas besteiras coronel? O senhor vive
dizendo essas histórias, diz que fala com o seu pai, isso é coisa ruim! — Larga de ser bobo Joaquim, meu pai sempre acreditou
que existia vida após a morte e eu também acredito.
Os dois amigos passaram o dia conversando, mas quando anoiteceu, Juvêncio não quis jantar, despediu-se de Joaquim e foi deitar. — Boa noite Joaquim, faça o que eu pedi, hoje vou deitar
mais cedo, pois não estou me sentindo bem, sinto um aperto muito grande por dentro do peito e minhas pernas estão geladas, não sei por que estou sentindo tanto frio.
Joaquim foi para sua casa e o coronel foi para o quarto e deitou-se na cama com as pernas cada vez mais geladas. Isabel deitou-se ao seu lado, mas ambos permaneceram em silêncio, depois de alguns minutos o coronel olhou para a janela e viu que seu pai e sua mãe o observavam. Logo percebeu que sua vida terrena havia chegado ao fim, fechou os olhos e se permitiu seguir com eles. Quando amanheceu, Isabel estranhou pois seu marido estava demorando para se levantar e foi chamá-lo, mas quando o tocou, percebeu que ele não estava mais ali, debruçou-se sobre o corpo e chorou desesperadamente. Chica e Joaquim ouviram seu choro e vieram ajudá-la, mas também não conseguiram conter as lágrimas. Mais tarde Joaquim resolveu todas as pendências a fim de organizar o velório. O padre foi chamado e realizou-se ali uma missa de corpo presente.
DIANA DE AGUIAR 6-O NEGRO SALVA O BRANCO 6 - O NEGRO SALVA O BRANCO Depois da morte do coronel, Manoel foi à cidade, conheceu Mercedes e a trouxe para a fazenda para viver como sua mulher. Mercedes tinha uma filha, Natália, e Manoel aceitou criá-la como se fosse sua. Isabel ficou muito contrariada com essa situação, mas não tinha pulsos para lidar com seu filho, pois além de tudo, ainda estava mandando os negros mais velhos irem embora da fazenda. Joaquim não tinha mais espaço como antes, fazia suas obrigações, mas logo voltava para sua casa, fazia de tudo para não se encontrar com Manoel, mas logo ele foi chamado. — Joaquim, o senhor pode ir embora, não precisamos
mais de seus serviços e sim de pessoas mais fortes, com mais vigor para tratar das criações.
Foi um golpe doído para Joaquim que saiu da casa e ficou um tempo encostado em uma paineira lembrando do passado, da bondade do coronel. As lágrimas foram escorrendo pelo seu rosto, naquele momento ouve um barulho e um boi furioso que arrebenta a cerca e sai desembestado. Joaquim olha para os lados e vê Natália, filha de Mercedes, brincando distraída no jardim. O boi sai
em direção da criança e o negro pula na frente do animal e o segura pelos chifres com toda a sua força, consegue virálo e os dois rolam no chão. Logo os peões veem o que está acontecendo e vêm ajudar Joaquim, amarram o boi, e ajudam o velho amigo, que só pede para encostá-lo na árvore. Quando Manoel ficou sabendo, não acreditava que Joaquim poderia ser tão forte a ponto de conseguir segurar um boi, nem um jovem poderia ter tanta força como ele teve. — Joaquim, vou te levar ao médico, o senhor salvou a
minha enteada.
— Não é necessário, cuida bem da sinhazinha, ela está
muito assustada, eu preciso ir embora que o patrão está me chamando. As lágrimas escorriam pelo rosto daquele velho e Manoel estava surpreso.
— Como pode o senhor arriscar sua vida para salvar um
branco?
— Eu te disse para cuidar da criança porque o patrão está
na minha frente, está me chamando, dizendo que precisa de mim.
Manoel ficou muito comovido com aquela cena, lembrouse dos ensinamentos de seu pai, e percebeu que ele tinha razão em sua postura em relação aos negros. Mas com o passar dos dias, o preconceito retorna ao
coração daquele homem. Isabel está muito apreensiva e triste, mas tenta de todas as formas impedir que seu filho maltrate aqueles negros. — Manoel, meu filho, você está destruindo tudo o que seu
avô e seu pai construíram nessa fazenda.
— Não se preocupe mãe, já contratei um capataz, ele é
experiente, trabalhou na fazenda do coronel Anastácio, conversamos e vi que ele tem os mesmos pensamentos que eu, vi seu jeito de administrar a fazenda e ele tem punhos de aço para lidar com essa negraiada.
— Meu filho, você está errado, as coisas não são bem
assim, do jeito que vivíamos nunca passamos necessidade, nem nós, nem seus irmãos na Europa, pois sempre tivemos fartura.
— Pois é mãe, esse é outro assunto a resolver, eles que se
virem por lá, nós não mandaremos mais nenhum dinheiro pra lá. — Enquanto eu for viva, nenhum filho meu vai passar
necessidade.
— Olha mãe, se a senhora faz tanta questão, mandarei a
metade do valor, vou escrever uma carta dizendo que estamos passando por dificuldades, depois da morte do pai, e eles vão entender, a senhora pode ficar despreocupada. Mas, quanto a esses negros nós não vamos entrar em acordo. — O seu pai tinha razão quando se preocupava tanto com
a morte dele, ele sabia da sua indiferença, você podia não só ter herdado essa propriedade, mas também a bondade que seu pai tinha no coração. Olhe só quantas dificuldades você está gerando, essa fazenda sempre teve boas produções sem que nenhum negro levasse uma chicotada, o seu pai lutou muito por essas terras. Mas saiba que vai chegar o dia que você vai envelhecer e você não terá a glória que seu avô e seu pai tiveram, todos têm medo de você, olha a Chica mesmo, quando você aparece ela sai correndo de medo, os negros querem ir embora desta fazenda. — Ora mãe, deixa ir, se todos os negros forem embora,
nós podemos arranjar outros, o que mais tem por aí é negro, e, se for o caso, arrasto qualquer um pela orelha e ponho em casa de novo. — Pois é, mas, segundo os ensinamentos de seu avô e do
seu pai, as coisas não deveriam acontecer desta forma, você deve respeitá-los como sempre aconteceu nesta fazenda, enquanto eu for viva, quero fazer de tudo para que esses negros sejam bem tratados. DIANA DE AGUIAR 7-A APARIÇÃO 7 - A APARIÇÃO
O padre Miguel havia considerado as ameaças do coronel, e mesmo depois de sua morte, estava honrando a promessa de cuidar de Laura. Dona Celestina tinha muito amor pela menina, ensinou-lhe a ler, escrever, rezar, bordar, costurar,
tudo que uma mocinha de família deve saber. Laura também estava instalada com mais conforto em um quarto dentro da casa paroquial e fazia apenas serviços leves, ajudando na organização da casa. Um dia Laura estava em seu quarto fazendo suas orações como de costume, e sentiu uns arrepios, abriu os olhos e viu a imagem do coronel Juvêncio. — Minha filha toda a minha vida eu quis te proteger.
A menina estava morrendo de medo, não queria ouvir aquelas palavras, mas não tinha forças para sair correndo dali, pois não conseguia se mexer, suas pernas estavam bambas. — Não há com o que se preocupar, não tenha medo! Eu
não sou um fantasma, nem assombração, sou seu amigo e o seu avô está junto comigo.
Neste momento ela encontrou forças e saiu correndo dali e foi ao encontro de dona Celestina. — Madrinha, o coronel apareceu na minha frente e
conversou comigo, disse para eu não ter medo, mas minhas pernas tremiam, estou morrendo de medo e não consigo entrar no quarto.
— Minha filha, o coronel foi um bom homem, e gente
assim está perto de Deus, são as almas boas que não têm maldade no coração, não precisa ter medo. Tenha tranquilidade quando ele vier outra vez, fique calma, e não conte nada para o padre, pois ele não acredita nessas
coisas, ele acha que isso é contra a igreja católica, não acredita na comunicação com os mortos. Ainda assustada Laura pede. — Madrinha, a senhora pode rezar comigo no meu quarto?
Não quero ir para lá sozinha.
— Ora minha filha, vamos sim responde a boa senhora.
As duas foram então rezar no quarto. Laura deitou-se em sua cama e dona Celestina sentou-se ao seu lado, mas a menina logo pegou no sono e sua madrinha foi embora para sua casa, pois também estava muito cansada, ajeitouse para deitar-se e também logo dormiu. Mas Joaquim invade seus sonhos, ela o vê dentro da igreja e fica muito assustada. — Joaquim você não pode entrar aqui! — Posso sim dona Celestina, essa é a verdadeira casa de
Deus, nessa igreja entra o preto e o branco, essa casa é dedicada a todos, pois não foi construída pelas mãos dos homens, e sim pelas mãos de Deus. Mas me diga, como está minha neta? Está aprendendo tudo direitinho?
— Sim, ela está bem, e aprendeu muita coisa, é uma boa
menina.
— Então cuide bem dela, pois Deus lhe dará um trabalho
muito importante.
Joaquim virou-se de costas e saiu andando ao infinito, colocou um chapéu branco na cabeça, olhou para o céu e abriu um largo sorriso. Dona Celestina acordou assustada, estava confusa se aquele sonho havia sido uma fantasia por conta de sua conversa com Laura ou se teria sido mesmo realidade. No dia seguinte, ao chegar na igreja, dona Celestina ainda estava com aquele sonho em seus pensamentos e foi logo contar à Laura. — Laura, minha filha, você não vai acreditar no sonho que
tive esta noite, sonhei com seu avô, ele apareceu na igreja e eu disse a ele que não poderia entrar, mas ele insistiu dizendo que esta era a casa de Deus, depois falou que o Senhor lhe dará um grande trabalho. Laura ouviu as palavras de Dona Celestina e pensativa respondeu:-
— Graças a Deus, eu dormi a noite toda e não me lembro
de sonhar com nada, nem com ninguém.
— Então vamos trabalhar, eu vou limpar a igreja e você
limpa tudo aqui dentro, deixa tudo limpinho, que amanhã vai ter missa e o padre gosta de tudo organizado. DIANA DE AGUIAR
8-O
SOFRIMENTO 8 - O SOFRIMENTO Passaram-se alguns anos da morte do coronel e Isabel já estava com idade avançada e também muito cansada, lutando para viver, e, devido à idade, sempre apareciam algumas enfermidades. Mas ela permanecia firme pois não queria morrer e deixar os escravos nas mãos de Manoel. Porém, chega o dia em que seu corpo não aguenta mais. Ela só ficava na cama, sentia muitas dores, mas nunca desistia de tentar convencer Manoel de que seus pensamentos estavam errados. — Manoel, meu filho, meu fim está próximo, eu não
consegui mudar seu comportamento em relação aos negros, mas neste momento só te peço um favor, não deixe faltar alimento à Chica e à sua família, é só isso que te peço meu filho. Neste momento as pálpebras de Isabel foram pesando até que se fecharam por completo e a mão que segurava a mão de Manoel se afrouxou. O padre foi chamado, fez suas orações e Isabel foi enterrada ao lado de coronel Juvêncio, assim como era o desejo de ambos. Assim que terminou o enterro, o padre retornou à cidade, sentia um alívio imenso, pois com a morte de Isabel, o auxílio que recebia da fazenda Liberdade em troca dos cuidados com a menina Laura haviam terminado, e isso era um segredo que havia morrido com Juvêncio, Joaquim e Isabel. De agora pra frente ele poderia agir como
quisesse e sua primeira decisão foi tomar a propriedade que o coronel deu à Laura, pegou a escritura e colocou-a em seu nome. Logo retornou à igreja e já foi dando novas ordens à dona Celestina. — Laura voltará a dormir no quartinho de fora, e de agora
para frente será escrava da igreja.
Celestina horrorizada com aquela decisão retruca: — Mas não foi isso que o senhor combinou com o
coronel, eu não acho que o senhor está agindo certo.
— Ora Celestina, o coronel está morto e não pode me
cobrar, e é bom a senhora permanecer em silêncio, boca fechada não entra mosquito. Dona Celestina estava muito preocupada, pois já estava muito idosa e não poderia amparar Laura por muito tempo. Começou então a rezar por longas horas pelas almas do coronel e de Joaquim, pois a menina passou a ser muito explorada, alimentando-se somente de restos e exausta de tanto trabalho.
— Coronel, o senhor colocou em minha mãos uma missão
muito difícil e não estou tendo forças para executá-la. O padre Miguel nunca foi muito correto, mas de uns tempos para cá piorou muito, só pensa em dinheiro e em vaidade, por isso peço ao senhor e também à alma de Joaquim que tenham compaixão de Laura e que intercedam por ela. Dona Celestina sente calafrios e percebe a presença de Juvêncio e Joaquim no altar.
— Calma irmã, as coisas não acontecem como e quando
queremos, tudo tem seu tempo certo, não se esqueça que não cai de uma árvore uma folha sequer sem que o Pai não queira, e tudo o que nós fizermos teremos que pagar. Ao retornar à casa paroquial deparou-se com o padre sentado à mesa tomando seu café, enquanto Laura faxinava a casa.
— Sabe irmã Celestina, penso que devemos dar uns
corretivos nessa negra, pois a casa não está ficando muito limpa.
— O senhor está muito enganado! Laura limpa essa casa
muito bem, aliás tudo que ela faz é muito bem feito, eu deveria levá-la para minha casa, pois assim ela será bem tratada e lhe digo mais, o senhor tome muito cuidado, pois o coronel vai cobrá-lo a promessa que fez.
— Que promessa? O que eu lá tenho a ver com coronel? O
homem morreu, que Deus o tenha.
— É padre, eu sei que o senhor apoderou-se da
propriedade que o coronel deu à Laura.
— Por que uma negra iria querer uma propriedade, o sítio
agora pertence à igreja, e se pertence à igreja pertence também a mim, resmunga o padre com desdém.
A vida de Laura tornou-se um inferno, pois tudo era motivo para sofrer castigos terríveis, mas ninguém saía em defesa de um negro naquela época.
Mas a menina tinha muita fé em Deus, e nunca desistia de fazer suas orações, até que uma noite Joaquim apareceu novamente. — Não se assuste minha filha, sou eu, seu avô, venho lhe
dizer que falta pouco tempo pra consertarmos isso tudo de ruim que está lhe acontecendo. Laura ouviu atentamente tudo que seu avô lhe disse, mas logo ele retornou ao plano espiritual e ela reiniciou suas orações. DIANA DE AGUIAR 9-A FUGA 9 - A FUGA Padre Miguel estava cada vez mais desonesto, tentava tirar vantagem de tudo e de todos, estava em obsessão pelo dinheiro e explorava até mesmo os fiéis que colaboravam com a igreja.
Estava cada vez mais ranzinza e reclamava de tudo, do pão, do café, do almoço, da limpeza e descontava toda a sua raiva em Laura e dona Celestina, que já estava exausta daquela situação, entrou na cozinha pisando quente e deu um forte tapa na mesa. — Se houver por aí mais padres como o senhor, o mundo
está perdido! O senhor não é representante de Deus, não é digno de ser um padre, pois um padre tem obrigação de ter
amor no coração para ajudar os necessitados, o senhor só tem raiva, só tem ódio, eu já estou fraca e só me submeto a vir aqui para ajudar Laura e protegê-la de suas maldades. — A senhora não precisa mais vir aqui, nem na casa nem
na igreja, eu não preciso da senhora, tem muita gente para me ajudar na igreja.
— Pois é, padre, aqui o senhor é autoridade, todos te
respeitam, pensam que é um homem bom, mas, imagina só se um dia as pessoas souberem que essa pobre menina é livre e o senhor está escravizando-a. Deus vai lhe dar o que merece, Ele está vendo tudo o que acontece por aqui. O senhor acha que a alma do coronel está em paz? Pois saiba que eu tive sonhos com o coronel Juvêncio e com Joaquim e, desde então, essas almas passaram a me visitar.
— Que alma o quê? Depois que morre acabou, umas vão
para o inferno e outras para céu, alma nenhuma volta para a terra, que Deus os tenha. Mas isso pra mim não importa e sim cuidar bem do patrimônio da igreja, e saiba que eu não gostei desses assuntos da senhora não, e vou hoje mesmo lá conversar com o seu marido. — Pode ir conversar o que quiser.
O marido de dona Celestina era João Jesus, um carpinteiro, eles tinham oito filhos, mas somente Gilberto e José, que eram os mais novos, moravam com eles, os outros haviam se casado e mudado dali. João Jesus sempre foi um homem muito sério e seguidor das leis da igreja e, assim que dona Celestina terminou a conversa com o padre, foi para casa, pois precisava desabafar com seu marido.
— E aí minha velha? Já chegou da igreja? Nunca vi
alguém gostar tanto de igreja como você.
— Pois é, José, sempre fui mesmo muito dedicada à
igreja, principalmente depois que Laura veio para cá, a neta daquele seu amigo negro.
— Ah! O Joaquim, que o boi matou. — Isso mesmo, o Joaquim. — Aquele era um negro bom, uma pessoa muito boa. — Pois é, vou te contar um segredo, até então não tinha
contado a ninguém, eu já estou muito velha e bem mais fraca do que você, então vou lhe contar. Olha, bem antes do coronel morrer ele prometeu ao padre não deixar nada faltar à igreja, por isso o padre vive em tanta fartura, tem esse gado, foi tudo presente do coronel. Mas em troca ele deveria cuidar de Laura e ensiná-la tudo que soubesse, e a menina é uma negra livre, tem sua carta de alforria e também uma propriedade que o coronel lhe deu de presente, mas quem cuidou de Laura sempre fui eu. Depois da morte de todos na fazenda Liberdade, o padre colocou a menina como escrava, a trata muito mal, e ainda tomou o sítio para a igreja. Esse padre só pensa em dinheiro e explorar as pessoas. — É, eu já vi muita gente reclamando do comportamento
do padre, ele pede muito dinheiro durante as missas de uma forma que os fiéis tornam-se obrigados a colaborar, está cheio de empregados no sítio e não paga ninguém,
não quer nenhum escravo para não ter que tratar dele. — Estou muito preocupada com Laura, na minha falta eu
te peço que não deixe o padre judiar dela.
Mas com o passar dos dias dona Celestina, foi ficando cada vez mais fraca e, com pouca resistência, adoeceu. Seu marido cuidou muito bem dela, mas como já estava muito idosa não resistiu e faleceu. Sem as cobranças de dona Celestina o padre passou a castigar Laura mais severamente, a mocinha apanhava muito. O padre tenta abusar sexualmente dela, mas ela grita e esperneia tanto que ele fica com medo de chamar a atenção dos vizinhos e a tranca no quartinho de fora. No meio daquela madrugada, Laura consegue fugir, e tenta encontrar o caminho para a fazenda Liberdade a fim de encontrar-se com sua mãe e alguns parentes. Mas como desde criança não saía dali, acabou por perderse no caminho. Estava no meio da mata e quanto mais andava mais se perdia. O dia amanheceu, mas ela não encontrava uma saída, estava com medo e muito desesperada começou a gritar, chorar, mas naquele momento o coronel aparece em sua frente. — Calma, minha filha, está tudo bem! Joaquim foi buscar
ajuda pra você.
Naquele momento, numa propriedade próxima dali, havia um mestiço chamado Inácio, um escravo liberto que tinha o dom da mediunidade e que preparava-se ali para fazer as suas orações naquela mata, mas Joaquim apresenta-se a ele. — O senhor está vivo ou morto? — Qual é a diferença entre estar morto ou vivo, sou
apenas filho de Deus assim como você. Mas agora preciso de sua ajuda, há uma negra perdida, você deve encontrá-la e ajudá-la, é minha neta Laura, basta seguir as trilhas que dão ao riacho e, quando lá chegar, irá vê-la debaixo de um pé de jatobá. Joaquim desapareceu, imediatamente Inácio seguiu as orientações e entrou por aquela mata, foi andando até encontrar o riacho e bem acima avistou Laura, pensou nunca ter visto uma negra tão bonita e por ela se apaixonou. — Laura? — Como você sabe meu nome? — Um negro chamado Joaquim pediu que eu viesse ajudá-
la.
— Joaquim era meu avô, mas já morreu há muitos anos. — Mas eu vim para te buscar, vou cuidar de você.
Carregou-a com todo cuidado, pois estava muito
machucada pela surra do dia anterior e levou-a até a sua casa que era próxima dali. — Há quanto tempo você está perdida? — Desde ontem à noite, eu sou livre, não sou escrava, eu
era da fazenda Liberdade do coronel Juvêncio, mas ele me mandou para a igreja, para que pudesse estudar, mas depois que o coronel e todos da Liberdade morreram, o padre tirou tudo o que era meu, ele me batia e me tratava como escrava. — Você pode ficar por aqui o tempo que quiser e precisar.
Laura e Inácio tinham muita afinidade e conversavam sobre todos os assuntos. Ele começou a ensinar a ela tudo que sabia, pois era conhecedor das plantas, ervas e raízes. — Quando eu era bem pequeno, meu pai comprou essas
terras e mudei com minha mãe para cá, ele vinha nos visitar de vez em quando, meus pais não eram casados, pois minha mãe era negra e o meu pai branco. Os pais dele não aceitariam e nem sabiam da nossa existência, mas depois que minha mãe morreu, ele nunca mais voltou aqui e eu nunca fui atrás dele. Vivo aqui sozinho, crio alguns animais, planto mandioca, milho, feijão, mexo com raízes e curo as pessoas, faço remédios de ervas. Assim, como eu pude aprender tudo com a minha mãe, vou te ensinar a fazer isso também. Laura começou a aprender a mexer com as ervas e escutava atentamente tudo o que Inácio lhe explicava. — Meu pai era muito católico e ensinou muitas orações à
minha mãe, rezavam assim: "Pai que está nos céus, que criaste os céus e a terra, e deste ao homem o fruto para alimentar-se, neste momento dou graças, e peço, orientame ao rumo certo que devo dar a essa raiz para que faça o remédio" - Desta forma Ele me guia para que eu faça tudo certo. E juntos iniciaram a oração, mas naquele momento Joaquim e o coronel se apresentam a eles. — Minha filha, sua missão na terra começa agora, procura
aprender tudo o que pode e logo estarás de volta. Existe muito mal por aí, permaneça aqui, lembre-se: você não está sozinha, nós vamos te ajudar, até chegar o dia da sua morte. - Disse o coronel e Joaquim volta-se para Inácio.
— Meu irmão cuida com todo amor e todo carinho desta
moça, pois os céus enviaram à terra esta pérola preciosa e através dela as coisas vão mudar, por isso, todos os dias, cedo e a tarde façam as suas orações e nós estaremos por aqui, se for permitido pela graça de Deus. Encerrando aquelas orações, Laura e Inácio continuaram a estudar as ervas. DIANA DE AGUIAR 10 - AS COBRANÇAS 10 - AS COBRANÇAS O padre estava desesperado à procura de Laura, e todos já tinham notícia da escrava que fugiu da igreja. Fazia
orações a fim de conseguir recuperá-la, mas, em meio a tanta aflição abriu-se um canal mediúnico e o coronel conseguiu emitir vozes nos pensamentos do padre: "Eu disse que te perseguiria até mesmo depois da morte e sei tudo que você anda fazendo." O padre ficou encabulado, mas logo afastou aqueles pensamentos: - Ah, isso não é nada, são coisas da minha cabeça, morto está morto. Mas aqueles pensamentos sempre retornavam e o padre lembrava do combinado que tinha com o coronel, mas aquilo persistia cada vez mais nítido: "Eu estou aqui e sei que você pegou coisas que não lhe pertencem." O padre estava muito perturbado, andava de um lado para outro cheio de dúvidas, orava incessantemente pedindo a Deus que o livrasse daquilo, mas de repente ouviu outra voz. — Eu também estou aqui padre, devolva à minha neta o
que é dela.
Mas o padre tinha a certeza de que todos os que tinham conhecimento daqueles documentos e do combinado estavam mortos. Porém, não sabia como agir diante das vozes do coronel e de Joaquim que estavam lhe cobrando. Frente a tantos transtornos, o padre resolveu passar uns dias na propriedade que roubou de Laura, a fim de ter um descanso. Lá era um lugar muito bonito, tinha uma casa muito boa, muitas árvores e um riachinho com águas cristalinas que
se iniciavam em uma fonte perto da estrada onde todos que passavam por ali paravam para ver e beber daquela água. Ao chegar lá, o padre selou um cavalo e saiu para espairecer, parou diante daquela fonte, mas quando olhou para a água, viu no reflexo o rosto de Joaquim, de barba e cabelos brancos e chapéu na cabeça, olhou para o padre e sorriu, o padre logo sentou-se e sacudiu a cabeça, pensou estar delirando e ficou com aquilo no pensamento. Novamente aproximou-se da água e lá viu a imagem do coronel. — Eu estou aqui padre, eu disse que iria lhe perseguir.
O padre assustou-se, montou em seu cavalo e galopou rapidamente até a casa. Lá chegando, pediu a um dos funcionários que lhe trouxesse um copo de água. — Ora padre, mas daqui da varanda eu vi o senhor
agachado frente à fonte bebendo água.
— Mas eu não bebi, aquela água está suja. E quando
trouxeram a água e o padre foi beber, ele viu a imagem do coronel dentro do copo.
— Onde vocês estão pegando essa água? — Ora, vem da mesma fonte que o senhor não quis beber. — Não quero dessa água não, traga para mim um leite.
E assim que terminou de bebê-lo, percebeu que ainda
estava inquieto e quis ir embora. — Eu vim para descansar, mas aqui não estou encontrando
meios para isso, peça a Sebastião que vá comigo até à igreja, pois não estou me sentindo bem, outro dia eu volto para descansar.
Sebastião acompanhou o padre até a igreja, mas ao chegar lá, ainda estava com muita sede, encheu o copo e conseguiu bebê-lo sem ver a imagem do coronel, e logo pensou: - "Aquelas terras eram do coronel, por isso ele está por ali, mas como posso me livrar dele? Ah, já sei, vou juntar os coroinhas, alguns fiéis e vamos fazer uma missa naquela propriedade e com oração conseguiremos expulsá-lo daquela terra." Programou tudo para realizar aquela missa no sítio, colocou um altar embaixo de um pé de jatobá e levaram também algumas imagens de santos. Reuniu por lá muitas pessoas e em seu sermão ele pregava: — Tudo aquilo que Deus deu ao homem na terra, foi de seu merecimento, quando Jesus Cristo esteve na terra, nos mostrou que deveríamos ter compaixão para com os necessitados e cada um de nós deve se dedicar aos outros, pois tudo que é da igreja é de Deus e o que é de Deus é dos fiéis. Então, por isso que um bom pastor deve cuidar de tudo que foi dado à igreja. A bondade do coronel Juvêncio que nos deu essas terras deve ser valorizada, por isso, vamos rezar por sua alma para que descanse em paz e devemos orar também pela alma do Joaquim. E um fiel levantou e interrompeu. - Ora, mas Joaquim era
negro, o senhor nunca rezou pelos negros! — Por favor irmão, silêncio durante a oração.
O padre continuou fazendo as orações a fim de reunir forças através da fé dos fiéis para conseguir espantar aquelas almas. A cada vez que ele pronunciava os nomes de Juvêncio e Joaquim ele conseguia abrir um canal direto a eles e foi possível vê-los em pé junto às pessoas. Neste momento, os dois tiraram o chapéu da cabeça e o cumprimentaram. Imediatamente o padre encerrou a missa e retirou-se para casa. Procurou uma poltrona e sentou-se esfregando os olhos e Sebastião olhou para o lado, confuso com aquela situação inesperada. — Ora padre, eu até entendo o senhor querer rezar pela
alma do coronel, mas o Joaquim era um negro, e o senhor sempre disse que os negros têm sua própria religião e que não deveríamos misturar as coisas.
— Ai! Sebastião, eu nem sei por que eu disse isso, minha
cabeça não anda muito boa.
— Mas no que nós podemos te ajudar? — Em nada, vocês não podem me ajudar, eu vou embora,
preciso ir à igreja e rezar, pois lá eu estou guardado.
O padre juntou-se ao povo, pois já estavam todos indo embora. Ao chegar na igreja, deparou-se com dois homens vestidos de branco, mas não dava para ver o rosto, pois usavam capuz e estavam de cabeça baixa. Mas o padre não deu muita importância, dirigiu-se ao altar e começou suas orações em voz baixa e um dos homens falou para o padre.
Pode rezar em voz alta, nós também queremos ouvir — Pode suas orações.
O padre virou-se para trás e viu Juvêncio e Joaquim. — Reze Reze bastante padre e arrependa-se de tudo que você
fez, pois o inferno está preparado para lhe receber, mas, não vamos te perturbar por enquanto, vamos sumir por um tempo, na condição que você vá até o tabelião e regularize a propriedade e a alforria de Laura.
— Eu Eu faço o que for preciso para que vocês me deixem
em paz.
— Mas Mas não é só isso que você fez de errado e que precisa
reparar, a igreja não precisa de dinheiro, nem de propriedades, propriedades, mas você terá um tempo para para corrigir todos todos os seus erros. Joaquim e Juvêncio foram embora e o padre saiu da igreja desesperado. Com o passar dos dias tudo foi se acalmando, o padre sentia-se em paz, mas insistia em orar por Joaquim e Juvêncio durante durante as missas para para prevenir um possível retorno. Um dia, João Jesus, viúvo de dona Celestina, que já estava muito velhinho foi conversar com o padre depois da missa. — Padre, Padre, preciso conversar com o senhor.
Ora meu filho, pode falar. — Ora
— Sabe Sabe padre, eu venho à missa e rezo muito pela alma de
Celestina, ela ajudou muito o senhor nessa igreja, e ela tinha muito apego na menina Laura. Eu sei que ela fugiu, mas queria perguntar se o senhor teve alguma notícia dela, por que estou com maus maus pressentimentos. Tenho Tenho sonhado sonhado muito com o coronel e também com minha esposa Celestina, eles sempre me dizem que Laura está viva, e pedem para eu eu que lhe cobre cobre a propriedade propriedade que o senhor tomou da menina. Dizem que o senhor está com os dias contados, mas ainda há chance de o senhor tentar corrigir seus erros. Eu gostaria que o senhor seguisse o que o coronel pediu. Ah, pare com isso! Essas pessoas estão todas mortas, — Ah, isso é coisa da imaginação do senhor.
Olha padre as coisas não são bem assim como o senhor — Olha
pensa, o coronel coronel vai cobrá-lo pode pode ter certeza. certeza.
Eu não acredito nessas lorotas, se o senhor quer me — Eu assustar, saiba que não conseguiu.
Pelo contrário padre, eu não quero assustá-lo e sim — Pelo ajudá-lo a fazer o que é certo.
O padre tentava mostrar-se forte e crente que aquilo não era possível, mas por dentro estava morrendo de medo, pois também já havia encontrado-se encontrado-se com aqueles aqueles espíritos. DIANA DE AGUIAR 11 - O AMOR
ENTRE O JOVEM CASAL 11 - O AMOR ENTRE O JOVEM CASAL Depois de um mês, Laura já havia aprendido muitas lições sobre plantas, ervas e raízes. Juntos, Inácio e Laura faziam suas orações e sempre abriam canais mediúnicos e recebiam orientações de como usar os ingredientes e obter a mistura correta. Laura já sabia curar os animais, cuidava dos cães e bezerros doentes doentes e machucados. machucados. Até que um dia, dia, Inácio fere-se gravemente, chega com a perna com um sangramento muito forte pois escorregou e bateu numa pedra pontiaguda. pontiaguda. Pela primeira primeira vez, ela tem a oportunidade de cuidar de uma pessoa. Imediatamente, ela enrola aqueles ferimentos com faixas e busca pelas ervas e com a mistura pronta, ela vai massageando o local da ferida, e a hemorragia hemorragia cessa. Ela enrolou novamente a faixa, a fim de medicá-lo corretamente. Diariamente Laura refazia aquele curativo, mas depois de quatro dias o ferimento estava completamente fechado, e Inácio não sentia mais dores. — Qual Qual erva você usou?
Ora, as mesmas que você usa para curar os animais. — Ora, — Nossa Nossa Laura, fico realmente admirado em como você
aprende tudo tão rápido, eu demorei uma vida toda para aprender e, até hoje, ainda tenho dúvidas.
Que bom! Fico muito feliz! — Que — É É mas, eu vou aproveitar que já estou me sentindo
muito bem e vou até à cidade, vou vender alguns desses bezerros e comprar comprar alguns alguns mantimentos mantimentos e também algumas roupas para você. Nos extremos da cidade haviam haviam alguns sítios onde onde o comércio de animais era mais frequente. Lá chegando, Inácio mostra seus bezerros e o proprietário fica encantado em como os animais eram bem cuidados, e teve muito interesse em comprá-los por cinco contos de réis. Mas eu trouxe esse bezerros cangados, como farei para — Mas levar essa canga embora é muito pesada para levá-la nas costas.
— Ora, Ora, deixe a canga aqui e quando voltar da cidade, você
pega.
— Se Se bem que estou precisando de uma carroça, se eu
encontrasse uma para vender, seria bom.
— Não Não seja por isso, eu tenho uma carroça e posso vendê-
la por dois contos, precisa de alguns reparos, mas creio que em duas horas termino o serviço.
Isso é bom, mas não tenho animal nenhum para puxar — Isso essa carroça.
— Eu Eu te empresto um burro, aí o senhor põe a canga na
carroça, depois me devolve o animal. O negócio foi feito e Inácio saiu dali com três contos de réis, e saiu para a cidade a fim de comprar alguns vestidos para Laura, alguns mantimentos e materiais para a lida no sítio, gastou mais um conto e quinhentos. Pegou o caminho de volta e, antes do escurecer, chegou em casa. — Laura, trouxe-lhe estes presentes. Entregou-lhe os
pacotes com os vestidos e ela foi logo experimentar. Inácio notou a alegria estampada no rosto de Laura, afinal, ela nunca havia provado um vestido bonito, usava sempre roupas simples e de segunda mão. Os dois trocavam olhares apaixonados, mas Inácio tinha muito respeito por Laura. — Você está tão bonita, e eu fico tão feliz em tê-la aqui
comigo, passei tantos anos aqui sozinho.
— Foi muito bom nos encontrarmos Inácio, eu também
fico muito feliz e agradecida por ter sido acolhida por você.
— Você sabe que tenho sentimentos por você, mas quero
que saiba que também lhe tenho muito respeito, e nunca irei tocá-la.
— O sentimento é recíproco Inácio e, quando chegar a
hora, ficaremos juntos. DIANA DE AGUIAR
12 - A COLÔNIA DA FELICIDADE 12 - A COLÔNIA DA FELICIDADE Depois de muito tempo sem sentir a presença daqueles espíritos, Padre Miguel pensa estar livre das perseguições e continua com a mesma postura de antes, explorando os fiéis e arrecadando cada vez mais dinheiro e bens. Mas, conforme foi avisado, os espíritos retornam a fim de cobrar as dívidas ao padre. No momento em que ele estava fazendo as suas orações da manhã, ele sente as vibrações e percebe a presença de Juvêncio, Joaquim e Celestina. — Padre, viemos cobrar-lhe as suas dívidas, suas ações
não correspondem com as que um padre deve ter, a partir do momento que faz o juramento de servir a Deus e a seus fiéis com muito amor e dedicação. — dizia Celestina. Juvêncio aproxima-se do padre e ele sente-se muito mal.
— Padre, além do senhor descumprir a promessa que me
fez, está explorando esse povo e isso não está de acordo com as leis da Igreja. E, por fim, Joaquim fala ao padre.
— Padre, um cristão não deve lesar o outro, devolva o que
é de direito à minha neta. O padre tremia da cabeça aos pés, mas logo aqueles espíritos partiram para outro plano e deixaram o padre ali com suas orações e seus medos. No plano espiritual, os três amigos conversavam sobre o que fazer, pois deviam tanto ajudar aquele povo oprimido pelo padre, como também fazê-lo redimir-se com relação à Laura. Neste momento, Juvêncio dirige-se à Celestina. — Irmã, como pesa em nossos corações saber que os
homens não aceitam a missão que Deus lhes dá.
— São pobres seres que se apegam muito às coisas materiais, mas um dia todos entenderão. — explicou dona
Celestina.
— Ora, ora, mas o desencarne deste padre está próximo, não sei se ele consertará seus erros no tempo certo. —
afirmou Juvêncio.
— Mas, se ele não aprender agora, terá a chance de
aprender depois. Sabe coronel, quando desencarnei, fiquei meio perdida e confusa, estava muito triste por não ter tido forças para amparar Laura, mas, graças a Deus, fui acolhida por um espírito de luz. Nicolas, que me ajudou a entender e me desapegar das sensações do corpo e da matéria. Mas depois do descanso, meu amigo me disse que desse tempo ao tempo e que tudo se encaixaria, colocou a mão sobre minha cabeça e levou-me até a fazenda Liberdade. Mas foi num tempo passado e pude vê-lo
coronel, com muita saúde, e trabalhando com aqueles irmãos negros de igual para igual sem nenhum preconceito e muito respeito. Naquele momento recebi um ensinamento de que os verdadeiros homens de bem são aqueles que trabalham na construção de um mundo melhor, por isso Deus colocou o senhor na terra como exemplo. Mas logo dei-me conta que aquilo era uma colônia, chamada Liberdade. Irmão Nicolas também morava lá, pois era um espírito negro. - contou-lhe Celestina. — Já eu, quando deixei o plano carnal, acordei num
hospital, pensei estar louco, olhei para todos os lados e via enfermeiros e também irmãos doutrinadores nos orientando nesta nova fase. — explicou também o coronel. Joaquim também queria contar sua experiência. -Pois é irmão, eu também tive a oportunidade de estar naquele hospital, eram todos brancos e eu o único negro, mas muito se falava da colônia da Liberdade onde negros e brancos viviam muito bem, mas eu gostaria muito de conhecer irmão Nicolas.
— Pois não, vamos chamá-lo.
O pensamento de Celestina foi de encontro ao pensamento de Nicolas e um canal foi estabelecido e imediatamente os três espíritos foram encaminhados à colônia da Liberdade. Mas logo tiveram uma surpresa, pois o mentor era Juvêncio, pai do coronel Juvêncio, e o encontro de pai e filho foi de muita alegria.
— Como é bom encontrá-lo, meu pai! — Esse é o modelo de nossa fazenda na terra, como vocês
podem ver, temos muitos setores e vários tipos de trabalho, onde brancos e negros vivem em total harmonia trabalhando no engenho onde extraímos um néctar que enviamos aos hospitais a fim de tratar os doentes. Plantamos também muitos legumes que são enviados para a sopa dos doentes e para as colônias inferiores. Joaquim estava muito confuso e perguntou a Nicolas. — Irmão, por que um espírito precisa comer e beber? — Um espírito recém chegado ainda tem hábitos
materiais, tem muita ligação com o plano carnal, e por isso possui as mesmas necessidades de alimentação, mas esse alimento é fluídico, plasmado por energias que estabelecemos sobre aquelas plantas. O pai de Juvêncio dirige-se a Joaquim. — Ora meu filho, eu te vi nascer, vi crescer, olhe lá para
cima, está vendo aquela casa? É a casa de Laura, estamos tentando construí-la juntamente com a igreja. Joaquim olhou atentamente para a casa e para a igreja e viu que estavam muito destruídas, faltando portas, janelas, tudo quebrado.
— Ora, mas por que está tudo destruído? — A casa e a igreja estão assim devido às ações do padre
Miguel, ele está destruindo a própria moradia. Mas depois
de seu desencarne ele não virá para esta colônia, pois não terá força, energia e conhecimento para chegar aqui. Quem sabe depois de outras encarnações e evoluções, mas depois disso a igreja e a casa serão recuperadas. Veja a casa ao lado da igreja, é a casa de Celestina, está perfeita, pois ela sempre fez um bom trabalho na terra e, quando veio para cá, estava tudo conforme ela deixou. Assim é com todas as pessoas, se você fosse um médico na terra, iria para uma colônia ou um hospital trabalhar com os doentes. — Ora, mas como isso é possível, esta colônia da
Liberdade é idêntica a fazenda Liberdade.
— O plano espiritual e a terra são cópias uma da outra
para acolher nossos irmãos depois do desencarne, então tudo que você faz de bem feito na terra ao mesmo tempo está construindo por aqui também. Quando nossos irmãos atingem o conhecimento maior, vão construindo maravilhas e, ao voltar para terra, desenvolvem essas descobertas do plano espiritual. Mas, quando chegarem os tempos modernos não haverá mais escravos, mas haverá muito ranger de dentes, muita dor e sofrimento, haverá muitas guerras e fenômenos da natureza, pois a ambição do homem irá gerar um desequilíbrio. Mas nós, do plano espiritual, estaremos prontos para acolhê-los da forma necessária. Joaquim estava encantado com a perfeição da colônia. — Mas que lugar belo e maravilhoso.
— Que bom que gostaram daqui, eu os convido a
mudarem-se para cá e trabalharem por aqui, assim como a irmã Celestina. E, por um momento, Juvêncio entristece ao pensar que a fazenda Liberdade sob o domínio de Manoel, não deve estar tão bela quanto a colônia da Liberdade, mas Nicolas explica-lhe.
— Pelo contrário meu irmão, nossos espíritos de luz
interviram na energia de Manoel e daquela fazenda, pois uma é a cópia da outra e, se esta colônia está assim, a fazenda também está.
— Ora, mas como isso é possível? Meu filho não tinha
respeito pelos escravos.
— Mas com uma corrente de amor e boas energias,
conseguimos lhe mostrar o erro o qual direcionava suas ações perniciosas, causando prejuízo físico e moral aos seus trabalhadores. Por isso a morte de Joaquim foi necessária para tornar possível uma abertura psíquica e desta forma ele foi orientado através de suas vibrações, que influenciavam principalmente o capataz que Manoel contratou para castigar os negros. Esse homem teve muitas amizades e não sentia necessidade nenhuma de fazer algum mal àqueles trabalhadores, e, com isso, a fazenda vivia em perfeita harmonia. Seu filho acabou enxergando por que o senhor era tão amigo daqueles negros e essa mudança influenciou profundamente no funcionamento da colônia da Liberdade. — e Nicolas continuou — Mas vocês três têm uma missão na terra, devem ajudar Laura a construir sua casa,. Mas para isso ela deve recuperar o que
lhe é de direito, pois é lá que a jovem deve trabalhar com os seus remédios e ajudar os negros e também os brancos, foi preparada para isso, todo o sofrimento destinado a ela foi necessário para o seu aprendizado, como também o reconhecimento de sua missão junto a essas almas, que tanto necessitam de sua ajuda. DIANA DE AGUIAR 13 - A VINGANÇA 13 - A VINGANÇA Novamente aqueles espíritos retornam ao encontro do padre no momento em que ele está pregando o seu sermão aos fiéis durante a missa. Ficam parados no fundo da igreja. Neste momento eles viram um negro desencarnado aproximar-se dele, chamado Ripão, possuído por uma fúria e carregado de energias negativas, pois, quando estava a beira da morte, o padre negou dar-lhe a benção. Disse que negros não tinham alma, e o preconceito do padre fez com que Ripão desencarnasse mergulhado em ódio. Desde então esse negro jurou persegui-lo, estava sempre ao seu redor, cheio de raiva, e assim conseguiu possuir o corpo daquele padre e fez com que ele caísse no chão e tremesse muito. Os fiéis ali presentes o acolheram e o carregaram até uma cama. — O que está acontecendo padre? — Não sei, uma coisa ruim tomou conta de mim.
Logo o padre já estava se sentindo melhor, mas Ripão
estava sempre próximo e várias vezes o fazia sentir-se mal. Desta forma, as pessoas que conviviam com ele pensavam que estava endemoniado e decidiram buscar por outro padre, pois padre Miguel já não tinha mais condições de presidir as missas e a cada dia estava pior. Vem de São Paulo o padre Justino a fim de assumir as obrigações daquela igreja, é então passado a ele a situação em que se encontrava padre Miguel, que não poderia mais ser responsável pela paróquia local. Assim que chega à cidade, o novo padre faz questão de visitar todas as casas e armazéns. As pessoas vão dando todas as informações a ele, contando-lhe como era o comportamento do padre e o funcionamento da igreja, até que chega a casa de João Jesus, que já estava de muita idade e nem levantavase mais da cama. Ele conta ao padre Justino tudo o que sabe sobre padre Miguel, desde o início quando o padre chegou à cidade, como foi mudando com o tempo, sendo cada vez mais ambicioso, contou-lhe também tudo o que fez com Laura e sobre essa doença do padre. — É uma pena esse padre não ter seguido corretamente as
leis da igreja, nós, como representantes de Deus, devemos estar sempre olhando para o outro lado da vida e para o lado espiritual das coisas. Eu agradeço por todas essas informações, foram de grande ajuda, vou esforçar-me para ajudar no que for preciso. Padre Justino despediu-se de João Jesus e foi para a igreja. Lá é recebido por Benedito, um jovem que ajudava na
organização daquele templo. — Bom dia meu jovem, eu sou padre Justino, e venho
para ajudar padre Miguel.
— Bom dia padre, eu sou Benedito, que bom que o senhor
está aqui, vou levá-lo até o padre Miguel, ele não está nada bem, parece estar louco.
Entraram na casa paroquial e Benedito encaminhou Justino até o quarto de padre Miguel, abriu a porta, e o padre estava deitado com uma aparência muito ruim. — Que a paz esteja convosco padre Miguel. — Com o senhor também.
Padre Justino puxou uma cadeira e sentou-se ao lado do padre. — Eu sou padre Justino e vim para ajudá-lo, vamos fazer
uma oração.
— Ora, eu rezo o tempo todo, não preciso rezar agora.
Neste momento o padre percebeu que não era mais o padre Miguel que falava. — Qual o seu nome meu irmão?
Padre Miguel estava encolhido e com os olhos arregalados, possuído pelo espírito de Ripão.
— Não darei meu nome a ninguém. — Então posso chamá-lo de demônio? — Chame do que quiser. — Se não pode dizer seu nome, o que pode me dizer? — Eu sou aquele que estava morrendo, e esse padre me
disse que eu não tinha alma, jurei então que iria perseguilo, por isso aqui estou.
— Mas ele é um representante de Deus e o que você está
fazendo não é certo, pois as pessoas desta cidade precisam dele na igreja.
— Eu não tenho nada contra Deus e a igreja católica, meu
problema é com esse padre, eu estava doente, estava morrendo e ele se negou a me dar a benção, então ele vai ter que pagar. Benedito estava ali ao lado com os olhos arregalados, tremendo de medo daquela cena. Padre Justino pediu que ele fosse buscar um copo com água, ele buscou e colocou no criado mudo ao lado da cama, e o padre começou suas orações. — Deus Pai todo poderoso, criador dos céus e da terra,
creio em vossa palavra, creio em vosso amor, creio em vosso Filho, o Cristo Salvador, creio na força da igreja católica, eu vos peço que seja expulso esse demônio. Pegou a água e deu para padre Miguel beber. Naquele
momento o padre fica lúcido e padre Justino investiga. — Que história é essa de aprisionar e roubar uma negra
livre padre? João Jesus me contou tudo! Isso não é postura de um servo de Deus, sem contar tantas coisas ruins que o senhor tem feito por aí, explorando os fiéis e desfazendo de negros e pobres. O padre tentando se fazer de desentendido, pergunta: — O senhor veio me substituir?
— Não! Eu vim ajudar a igreja, quando o senhor tiver
condições, retornará ao seu posto, mas agora vou me retirar. O senhor descanse e reflita sobre seus erros, que são muitos. O padre Justino acomodou-se no quarto de hóspedes, ajoelhou-se frente a cama para rezar.
Neste momento as energias concentraram e Celestina, o coronel e Joaquim apresentaram-se a ele. Como ele já sabia da história de Laura reconheceu seus nomes. — Eu já ouvi falar de vocês, João Jesus contou-me toda a
história de Laura. Neste momento Joaquim afirma.
— Laura é minha neta e está viva! É necessário que o
senhor interfira de modo que Padre Miguel reconheça os documentos de alforria e de propriedade daquela fazenda e devolva tudo à Laura.
— Eu vou ajudar no que for necessário, ajudarei a igreja,
os fiéis e também Laura.
Celestina completou. - E acostume-se com sua nova morada, pois padre Miguel não retornará a suas funções, não terá mais condições de falar em nome de Jesus, pois não conseguirá se livrar desse espírito vingativo que o persegue. Ripão não é um demônio, é apenas um espírito perdido, mas que mesmo sobre o desejo da vingança, servirá para que esse padre consiga evoluir. — Cumprirei a minha missão de acordo com a vontade de
Deus.
Deitou-se e logo dormiu. DIANA DE AGUIAR 14 - A JUSTIÇA 14 - A JUSTIÇA Com o passar do tempo, Ripão toma o corpo de padre Miguel novamente e Benedito chama padre Justino para ajudá-lo em suas crises. — Eu sei quem é você meu irmão, seu nome é Ripão, o
que você anda fazendo não é o certo, isso é comportamento de pessoas ruins, são maldades, e desta forma vou ter que tratá-lo como demônio.
— Trate-me como quiser.
— Pois bem, mais uma vez eu vou mandá-lo ir embora, eu
não quero que você retorne e continue a perturbar o padre Miguel.
Padre Justino fez suas orações como de costume, e aquele espírito tomou outro rumo, mas sempre dava um jeito de sondar padre Miguel a fim de novamente voltar a atormentá-lo e concluir sua vingança. A cada vez que conseguia tomá-lo, o padre Justino era chamado. — Padre Miguel, o senhor só vai se libertar desse espírito
ruim no dia que devolver as terras de Laura. A cada coisa boa e a cada reparação de seus erros o senhor vai ter a oportunidade de afastar as energias ruins que o cercam e, desta forma, não permitirá que esses espíritos negativos aproximem-se do senhor. — Essa negra deve estar morta! — Ela está viva! — Mas onde ela está? — Não sei onde ela está, mas tenho certeza que ela está
viva, desta forma, sugiro ao senhor que vá até ao tabelião, que passe a escritura das terras para o nome de Laura. Com muita relutância padre Miguel pegou aqueles documentos e foi até o tabelião e passou tudo para o nome de Laura.
Estava explodindo de raiva, não conformava-se com aquela situação, dispor de seus bens à uma negra. Mas, tanta raiva e insatisfação fez com que aquele padre sofresse um derrame e teve seu corpo paralisado, ficando sob os cuidados de Padre Justino e Benedito, já que não tinha o movimento de seus membros e estava destinado a ficar na cama. Padre Justino tinha muita vocação e amor pela sua missão no caminho de Deus, aceitava todas as provações de coração aberto, disposto sempre a ajudar. Cuidava de padre Miguel e da igreja com muita disposição, mas estava empenhado em regularizar a situação de Laura, pois sabia que isto era seu dever e orava sempre pedindo auxílio a Deus para que tivesse êxito em suas tarefas. — Senhor Deus, Pai todo poderoso, ajude-me a encontrar
Laura para que eu possa ajudar essa jovem a cumprir a sua missão.
Neste momento, Celestina apresenta-se a ele. — Padre, amanhã estará frente à igreja um jovem mestiço
com sua carroça, ele o ajudará no encontro com Laura.
Ao mesmo tempo, Joaquim apresenta-se à Laura e Inácio durante as suas orações. — Inácio, meu filho, amanhã às nove horas você deverá
estar com sua carroça frente à igreja, um padre virá conversar com você, escute tudo o que ele lhe disser.
No outro dia, Inácio seguiu as orientações de Joaquim e estava em frente a igreja às nove horas em ponto, e padre Justino vai até ele. — Bom dia meu jovem, eu sou padre Justino, quero que
saiba que as coisas mudaram muito por aqui, e preciso que me leve até Laura.
— Mudou o quê? Padre Miguel vai matá-la! — Não! Ela já foi reconhecida como uma negra livre. — Como o senhor sabe dessas coisas? — Os espíritos de Celestina, Juvêncio e Joaquim estão me
orientando, e com a ajuda deles recuperamos a fazenda de Laura e vocês precisam assumir a casa e a missão que Deus lhes incumbiu.
— Mas nós não precisamos desta fazenda, vivemos muito
bem.
— Não tema meu filho, confie em mim, venha, preciso te
mostrar uma coisa.
Padre Justino levou Inácio para ver padre Miguel. — Veja meu filho, esse padre foi tão perturbado pelos
seus erros que chegou a esta situação, ele não apresenta mais riscos à Laura, por isso leve-me até ela, eu preciso conhecê-la.
Inácio aceitou o pedido do padre, ele subiu na carroça e os dois pegaram a estrada, foram conversando sobre a vida e sobre Laura. — Vocês têm uma missão naquela casa que deve ser
cumprida, a família de vocês deverá se mudar para lá.
— Não padre! Nós não somos casados, não temos filhos,
nos gostamos muito, mas eu tenho muito respeito por ela e só vou tocá-la quando o senhor nos der a benção.
— Ora meu filho, mas você sabe que não é permitido fazer
casamento de negros dentro da igreja, eu não concordo com essa regra, mas não tenho poder para desfazê-la.
Logo a carroça chega ao sítio e Laura espanta-se ao ver aquele padre. — Não tema minha filha, eu venho em paz! E Inácio
convidou o padre a entrar e serviu-lhe um café e alguns biscoitos, mas Laura permaneceu em pé sem entender o que acontecia. — Laura, minha filha, eu vim buscá-la. — O senhor está louco, eu sou considerada uma negra
fugida.
— Está enganada, você é reconhecida como livre e sua
propriedade lhe foi devolvida, padre Miguel está pagando seus pecados, está muito doente e à beira da morte, por isso não oferece mais nenhum risco a você, por isso preciso que retorne e assuma sua propriedade e sua missão.
— Desculpe-me padre, mas eu não posso retornar àquele
lugar, o senhor não sabe o que passei por lá nas mãos daquele padre.
— Minha filha, perdoe aquele padre assim como Deus nos
ensinou a perdoar o próximo, arrume seus pertences pois ainda hoje precisamos voltar.
— Se esta é a vontade de Deus, cabe a mim obedecer.
Neste momento uma tristeza toma o coração de Inácio e Laura olha em seus olhos com ternura. — Você vai ficar aqui ou irá comigo? — Minha vontade é estar sempre ao seu lado. — Então vamos juntos! Imediatamente os três sobem na
carroça e retornam à cidade. Da estrada Laura avista a casa da fazenda, ao chegar lá o padre nota o companheirismo e o amor daquele casal.
— Na igreja não é permitido realizar o casamento de
negros, mas farei nesta fazenda o enlace de vocês, as leis e o tabelião não reconhecerão este matrimônio, mas terão o mais importante que será a benção de Deus, e aquilo que Ele une, o homem não separa. O jovem casal estava muito feliz e preparados para assumir sua missão, Inácio fazia os reparos naquela casa e Laura se encarregava da limpeza. Depois de alguns dias, já estava tudo muito bem arrumado.
Receberam a visita do padre e o enlace matrimonial foi feito, sem testemunhas, sem convidados, afinal o que importava naquele momento era a benção de Deus para aquele casal apaixonado que iniciava uma nova fase de vida. DIANA DE AGUIAR 15 - O PERDÃO 15 - PERDÃO Padre Justino estava muito dedicado às suas obrigações, cuidava da igreja e dos fiéis de acordo com os ensinamentos de Deus, cuidava de padre Miguel e percebia que aquele homem estava na hora de partir para o plano espiritual, mas não tinha forças. Fez suas orações a fim de ajudar aquele padre, mas percebeu que ainda haviam pendências a serem resolvidas e a imagem de Laura veio em seu pensamento: " — Sim, somente o perdão de Laura pode libertar esse homem." Imediatamente o padre segue para a casa de Laura. Ao chegar lá, espanta-se ao ver uma família de brancos esperando que Inácio buscasse algumas ervas a fim de curar a criança que estava nos braços de Laura. — O que está acontecendo aqui? Laura explica ao padre que Inácio encontrou essa mãe desesperada na cidade pois nenhum médico conseguia
curar seu bebê e ofereceu ajuda. — Por favor Laura, venha comigo, também preciso muito
de sua ajuda, tenho certeza que Inácio pode cuidar desta criança, venha comigo. Laura concordou com o padre e o acompanhou até a igreja. Com muito receio, olhava para aquele padre que lhe fez tanto mal, estendido naquela cama.
Ao aproximar-se, a jovem percebe que não era o padre que estava naquele corpo e conversa com o espírito de Ripão, disposta a ajudar. — Você precisa ir embora meu irmão. — Não, esse padre me fez muito mal. — Mas se você continuar a atormentá-lo estará atraindo
coisas ruins, você deve procurar a luz.
A voz serena de Laura afastou o espírito de Ripão e o ajudou a encontrar seu caminho. — Padre Justino, o espírito afastou-se de padre Miguel e
já foi amparado por espíritos de luz que o ajudarão.
— Nossa Laura, você tem muita luz e força, eu fiz tantas
orações, fiz tudo que pude e não consegui afastar esse espírito, nunca vi coisa igual.
Neste momento Joaquim apresenta-se a eles e explica.
— O nobre irmão padre é dotado de muito conhecimento,
mas existe um outro mundo ao qual o irmão não consegue intervir. Assim como Laura disse, esse espírito já foi encaminhado e está sendo amparado por outros espíritos, mas agora levarei este outro. Por isso lhe peço que continue com suas orações para que possa nos ajudar na libertação desta alma confusa. Laura e Padre Justino percebem que Padre Miguel já não está entre eles.
Celestina e Juvêncio estavam com Ripão e aguardavam por Joaquim que veio na companhia de Miguel. Juntos seguem as zonas umbralinas até uma igreja onde não havia luz, onde estavam tantos padres que também não seguiram os ensinamentos de Deus na terra. Mas ao ver Joaquim e Ripão aqueles padres criam muita confusão por não aceitarem negros entre eles, eis que então surge Expedito, que também era negro, para organizar aquela igreja de forma que negros e brancos convivam normalmente. Joaquim, Celestina e Juvêncio retornam à colônia da Liberdade e vêem que a igreja e a casa de Laura estão cada vez mais bonitas, pois tanto padre Justino quanto Laura, estão cuidando para que isso aconteça. DIANA DE AGUIAR
16 MISSÃO CUMPRIDA 16 - MISSÃO CUMPRIDA Laura retorna à sua casa a tempo de ajudar Inácio na cura daquela criança e a família de brancos fica imensamente agradecida, pois os médicos não deram esperança de cura a eles. Espalha-se rapidamente a notícia do casal que curava através das ervas e também de um culto espiritual. Até que Fernando, um temido coronel que era muito cruel com os escravos, tem um grave acidente ao cair de um cavalo e foi levado à casa de Laura. — Nós vamos cuidar de você Fernando. — Fernando não! Coronel Fernando. — Como Fernando eu posso lhe curar, agora como
coronel não, o senhor prefere ficar com esse braço doendo para sempre ou aceitar Jesus e as orações de uma negra? — Faça o que você quiser, eu preciso é me curar. — O senhor não entendeu, aqui seguimos as leis de Deus e
nossa casa está aberta a todos que precisarem, e é para isso que estou aqui.
— Mas dizem por aí que a senhora é uma negra fugida.
— Negra eu sou, e desta cor me orgulho muito, mas o
senhor é branco e se não melhorar o seu jeito de pensar o seu braço não vai melhorar. Isso é um castigo que veio de cima, por que se fosse de baixo eu lhe curaria como coronel, mas a escolha é sua, o senhor quer mudar? Receber o Cristo e a cura através de uma negra?
Neste momento o coração do coronel Fernando foi tocado pelas palavras de Laura e assim ele aceitou aquela cura. — Esta cura não é para sempre, só o senhor pode mantê-lo
bem, procure sempre evoluir e ser uma boa pessoa.
O coronel foi para sua casa sentindo-se muito bem, mas, com o passar dos dias voltou a ser aquele homem cruel que maltratava os negros e fazia muito mal às pessoas. Com isso, o seu braço começou a doer fortemente, assim ele retorna à casa de Laura gemendo de dor. — Será que é tão difícil o senhor mudar? Lembra-se do
coronel Juvêncio, faça como ele, seja bom patrão assim como ele foi na fazenda Liberdade, e com isso o senhor vai melhorar. Coronel Fernando retornou à sua fazenda e cada dia ia melhorando sua forma de pensar e de agir, tornou-se um novo homem. A cada cura a casa de Laura ia ficando mais conhecida, e aquela fazenda tornou-se um laboratório de ervas fitoterápicas, atendendo as necessidades de todos os irmãos.
A jovem cumpria a cada dia sua missão, sempre muito dedicada ajudando os doentes, fossem eles pobres, ricos, negros ou brancos. Laura e Inácio não tiveram filhos, mas dedicaram toda a vida em prol de todos que por eles procuravam. Com o passar dos anos, chega o momento de Inácio deixar o plano carnal e, depois de passar pelo sono da morte, ele desperta em sua casa na colônia da Liberdade e é amparado por Celestina. — Seja bem vindo meu filho, prepare-se pois logo iremos
receber Laura.
Laura permanece na terra ainda por mais algum tempo recebendo cada vez mais doentes à procura de cura. Muitos fazendeiros levavam seus escravos, mas ela já estava com idade avançada e foi enfraquecendo até o momento que chegou também a sua hora de partir para o plano espiritual. Ela é recebida com festa em sua casa na colônia da Liberdade por Inácio, Juvêncio, Isabel, Celestina, João Jesus e Joaquim. Aquela casa continuou os seus trabalhos ao lado de seus amigos, pois as suas curas e seus remédios que agora eram em forma de fluidos ajudavam os espíritos sofredores nas zonas umbralinas. *********************************************** ***********************